No dia 8 de outubro apresentarei o artigo entitulado O design de interação em ambientes de ubiqüidade computacional, no 3º Congresso Internacional de Design da Informação, em Curitiba.
Assisti recentemente ao filme Três irmãos de sangue, de Ângela Patrícia Reiniger.
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Betinho, Henfil e Chico Mário.
A belíssima história dos irmãos Souza, a genialidade e o talento particular de cada um, sua luta, seu comprometimento com o Brasil e com o povo brasileiro são de fato um exemplo. A tragédia de suas mortes, fruto da irresponsabilidade do governo brasileiro, é um crime para o qual não houve julgamento ou sentença. Impossível não se comover com o filme.
A despeito de todas as qualidades do filme, durante a projeção me incomodou sobremaneira a baixa qualidade das imagens. O cinema nacional, como se sabe, não conta com uma estrutura semelhante a do cinema americano. A despeito da qualidade de nossos cineastas, a verdade é que o dinheiro anda curto, e muitos têm optado pela captação de imagens com câmeras digitais, que nem sempre primam pela qualidade de imagem. Entre fazer o filme com câmeras digitais menos poderosas e não fazer o filme, a opção parece óbvia. Sacrificar a qualidade da imagem é um preço justo, para um mercado cinematográfico quase quixotesco.
De qualquer forma, como o filme mistura imagens de arquivo (em diversos formatos, do vídeo à película) achei curioso perceber que a qualidade de algumas imagens antigas era ainda superior a qualidade das imagens captadas atualmente, com formato digital. Muitas cenas do filme apresentavam cores supersaturadas, baixa definição de grão, luzes estouradas em áreas de muito brilho, capacidade limitada de nuance dos matizes…as câmeras digitais têm uma série de limitações que me incomodam profundamente.
Já tinha tido a mesma impressão com o filme Cartola, documentário feito com muitas imagens de arquivo e algumas entrevistas contemporâneas, nas quais a qualidade das imagens é baixa. Esse parece ser o paradigma da produção nacional atualmente. São poucos os filmes que ainda resistem e conseguem fazer gravações em película. A maioria atualmente tem optado pelo formato digital, a película só é utilizada no final do processo, quando o filme é preparado para distribuição. Mas mesmo no formato digital, existem diferentes opções de câmeras, com qualidade muito superior a que parece ter sido utilizada nos filmes brasileiros Cartola e Três irmãos de sangue.
A produção de imagens digitais é cada vez maior atualmente, não só no cinema. As câmeras digitais de média/baixa qualidade se espalham cada vez mais, e a era dos fotogramas parece ter os dias contados…alguns laboratórios fotográficos estão inclusive deixando de fabricar papéis e químicos necessários para as ampliações fotográficas tradicionais, especialmente em preto e branco. O que era corriqueiro começa a ficar tão raro que se torna artigo de luxo. O mesmo processo ocorrido com o Super 8, formato relativamente popular na década de 70, um formato quase caseiro de produção cinematográfica e que atualmente é uma raridade, tendo um custo altíssimo para ser utilizado. Infelizmente, a qualidade da imagem começa também a ser artigo raro – ou caro. Ou se tem um equipamento antigo, para o qual a produção da imagem começa a se tornar rara (dada a falta de laboratórios para gerar as cópias), ou se tem equipamentos de ponta, caríssimos, que têm ótima qualidade apesar do formato digital.
As pessoas parecem não se importar com isso. Câmeras digitais em celulares, câmeras digitais com baixa resolução, impressões de fotos em papel de baixa qualidade…nada disso parece incomodar o cidadão “comum”. Como designer, me sinto aflito vendo a produção de imagens de nosso tempo ter uma queda de qualidade tão grande. O registro de nosso tempo está sendo feito de maneira tosca, e para isso não há remédio.
Se as fotografias que registraram o cotidiano do começo do século passado permanecem com alta qualidade até os dias de hoje, acho pouco provável que a produção contemporânea, feita pelo cidadão comum, resista tanto tempo. É curioso que ao mesmo tempo em que a tecnologia avança, tenhamos um retrocesso na qualidade da produção de imagens.
Que venham as novas gerações de máquinas digitais, com melhor qualidade e fidelidade de reprodução de luz e de cor. E que com elas possamos ter imagens de qualidade novamente!
Em 2003 escrevi um post apontando para uma lista de designers brasileiros que se dedicavam à tipografia. A lista era compilada por Luc Devroye, da School of Computer Science da McGill University, em Montreal, Canadá.
O endereço apontado no post original foi alterado e como não havia qualquer informação além do link, seria praticamente impossível achar a página novamente. SERIA, caso não existisse o Internet Archive. Através dele foi possível achar uma cópia da página, e pelo nome do autor encontrar o endereço atual do site. Ele continua fazendo um excelente trabalho de pesquisa sobre a produção tipográfica mundial. Vale conferir.
Ah! A lista de designers brasileiros que projetam famílias tipográficas ainda existe – assim como listas equivalentes de designers de diversos países. Os tipógrafos tupiniquins estão na url http://cg.scs.carleton.ca/~luc/brasilfonts.html
O livro Hungry Planet apresenta fotografias de famílias ao redor do mundo, exibindo os alimentos que consomem ao longo de uma semana. As diferenças são gritantes e fazem a gente pensar no que é alimentar-se.
Para mim, o conceito de “cesta básica” nunca foi tão explicitamente relativo. Além da imagem, o livro apresenta um perfil completo da família e o custo em dólares da alimentação semanal. Enquanto algumas famílias gastam menos de 5 dólares por semana, outras chegam a gastar 500. O curioso é que em geral as famílias fogem dos estereótipos mais comuns, como “obesos” ou “famélicos”. Em todas as fotos, o que se vê são famílias aparentemente saudáveis e felizes.

A família Revis, de North Carolina. US$ 341.98 em junk food para 4 pessoas

A família Namgay de Shingkhey Village. US$ 5.03 em verduras, legumes e frutas para 13 pessoas
É interessante também a história paralela que essas fotos contam, pode-se fazer uma espécie de “arqueologia” visual. Não somente a gente vê as famílias e o que comem, mas o ambiente no qual essas pessoas vivem. Cada objeto faz parte de um quebra-cabeças visual que sugere uma história. Para quem gosta de análise da informação – me desculpem o trocadilho infame – é um prato cheio.
Veja algumas fotos do livro Hungry Planet no site da Time.
Comentei anteriormente sobre Calm Technology, uma visão de que o desenvolvimento tecnológico deve buscar um caminho mais “amigável”. Basicamente, vigora a “lei do menor esforço”, ou seja, a tecnologia deveria ser tão simples que a gente usaria sem gastar muitos neurônios. Na falta de uma tradução oficial, eu me arrisco a cunhar a expressão tecnologia sem estresse.
Um bom exemplo disto é Ambient Umbrella, o guarda-chuva desenvolvido pela Ambient Devices.

A idéia é resolver um problema corriqueiro: levar ou não o guarda-chuva, quando for sair de casa? Vai chover ou não? O guarda-chuva será necessário ou será um estorvo?
Normalmente para resolver esse dilema, uma pessoa procuraria se informar sobre as condições climáticas do dia. Veria a previsão do tempo em um jornal, ou acessaria um site (via web, celular etc.) com a previsão do dia, ou ainda ligaria a TV no canal do tempo. Além, é claro, da clássica olhada pela janela para conferir as nuvens e o vento – o que nem sempre é confiável, especialmente para quem não entende muito do assunto.
No meu caso particular, como não compro jornal e não tenho canal de televisão com a previsão do tempo, só me restaria olhar pela janela e arriscar um palpite, ou ligar o computador e procurar a informação em algum site como o Climatempo ou o Yahoo!Weather, o que consumiria tempo e energia. Teria que ligar o computador, entrar no site, solicitar a informação, interpretar a informação recebida, para só então saber se iria chover ou não. Uma série de passos para ter uma informação simples me tomariam algum tempo, demandariam esforço cognitivo e com certeza uma boa dose de paciência.
O guarda-chuva em questão apresenta a informação de maneira óbvia. Se a previsão for de chuva, o cabo emite uma luz. Basta uma olhadela para o guarda-chuva, e ele mesmo indica se você precisará dele ou não.

O que parece simples, na verdade é um sistema relativamente complexo. O guarda-chuva recebe informações sobre o clima via ondas de rádio de um site especializado. Dependendo do prognóstico, a luz do cabo acende. A beleza está no fato de que o usuário não precisa fazer nada, e a informação está completamente contextualizada. Um caso típico de “tecnologia sem estresse”.
Na Calm Technology a informação fica na periferia de nossa percepção. Ela é percebida, sem que no entanto ocupe o centro de nossa atenção, de maneira que possamos fazer outras atividades, mas pode ser deslocada para o centro quando quisermos. Esse deslocamento entre o centro e a periferia da nossa percepção é uma das principais características da Calm Technology – uma tecnologia sem estresse, que poupa nossos neurônios ao trabalhar no pano de fundo de nossa percepção.
Minha intenção aqui não é tanto dar um exemplo de produto, mas apresentar um conceito…a tecnologia não precisa ser complicada, não precisamos ficar o tempo todo clicando botões, dando comandos para obter as informações que precisamos, e ao mesmo tempo as informações podem ser apresentadas discretamente, sem sobrecarregar nossa percepção com estímulos desnecessários.
Quem trabalha com design ouve muito a respeito de “projetos centrados no usuário”, especialmente no campo de design para web. Da teoria à prática, muitas vezes a distância é grande. Mas é interessante perceber que nem sempre é necessário tanto esforço ou investimento para tornar os sites mais adequados para as pessoas que de fato usam seus serviços. Muitas vezes pequenas alterações podem ser feitas e melhorar bastante a vida dos internautas. Mas, como saber que alterações devem ser feitas? A resposta parece óbvia…observando o comportamento dos usuários!
O Orkut, provavelmente o site de relacionamentos mais utilizado aqui no Brasil, tem feito isto de maneira inteligente. A partir das estatísticas que apontam as funções mais utilizadas, dos pedidos feitos no seu help-center, a equipe que desenvolve o Orkut tem feito pequenas alterações que mudam minimamente a interface e o produto ao longo do tempo, e que sem dúvida trouxeram melhorias na experiência de usar o Orkut.
Dois exemplos disso, que me parecem estar diretamente relacionados não às idéias e “sacações” dos projetistas, mas às necessidades dos usuários, expressas pelo uso que fizeram do produto: o link de reply, visível em cada mensagem deixada no scrapbook, e a função de exibir ou não a relação de pessoas que visitaram sua página (e da mesma forma, de deixar que as pessoas saibam que você visitou suas páginas).
Me despertou muita atenção a popularização do Orkut no Brasil. Lembro quando vi pela primeira vez este site de relacionamentos, quando estava envolvido com um projeto semelhante na empresa em que trabalhava. Naquele tempo já havia alguns produtos do mesmo tipo, como o Friendster, mas curiosamente quem vingou por aqui foi o Orkut. Hoje o Orkut é praticamente “brasileiro”, de tantos internautas deste país usando o site americano. É difícil dizer qual a influência que nossa cultura teve no desenvolvimento do Orkut, mas o fato é que os brasileiros usam de maneira singular este site.
Por aqui, duas funções principais parecem ter se destacado: bisbilhotar a vida alheia e usar o scrapbook para troca de mensagens. É impressionante como o scrapbook, cujo próprio nome indica uma função pouco nobre (um espaço para anotações, rascunhos), tranformou-se praticamente em uma ferramenta de email. Já ouvi pessoas dizendo que preferem usar o Orkut para mandar emails, porque sentem maior proximidade com as pessoas pelo simples fato de ter a foto ao lado da mensagem, sem se importar com o fato de que as mensagens podem ser lidas por qualquer um.
Provavelmente por conta desse hábito ter se mostrado intenso, ao longo do tempo foi inserido o link para “responder” a mensagem deixada em seu scrapbook. Antes, era necessário entrar na página de quem enviou a mensagem, abrir o seu scrapbook e só então deixar uma resposta. O link de reply facilitou bastante essa ação! Quem sabe no futuro haverá um link para encaminhar os scraps para outras pessoas? ;-)
Outro uso comum é “bisbilhotar” a vida alheia. Assim, ao longo do tempo o Orkut passou a apresentar a relação de pessoas que visitaram sua página – desde que você também permita que as pessoas saibam que você visitou a página delas. Para os mais xeretas, existe a opção de fazer visitas sem deixar rastros – o que, por sua vez, faz com que seja impossível saber quem visitou a sua própria página!
Essas duas funções, aparentemente simples, não faziam parte das primeiras versões do Orkut. Sem dados que confirmem minha hipótese, tudo não passa de especulação, mas me parece bastante provável que essas mudanças tenham surgido a partir da observação de como o Orkut vinha sendo usado.
Algumas pistas que podem reforçar minha hipótese estão presentes no no blog oficial do Orkut. Em alguns posts os desenvolvedores dizem explicitamente que determinadas funções foram implementadas a partir de pedidos dos usuários, e outras pela observação da maneira como o site vinha sendo usado. Um exemplo recente disso está no post Spice up your Scraps!, do qual reproduzo um trecho abaixo:
Sending scraps to friends has always been the most popular way to stay in touch on orkut. Despite having only colored text and smilies to play with, you have gotten creative and left some pretty impressive ASCII art in each other’s scrapbooks over the past few years. So, we’ve listened to your requests: and over the next week we’re rolling out a feature that will let you to express yourself by leaving rich content scraps for your friends.
Ao observar o hábito de deixar mensagens com desenhos feitos em ASCII nos scrapbooks, os desenvolvedores resolveram criar uma nova função para tornar as mensagens mais “carregadas” graficamente.
Este é um exemplo a ser seguido: fique de olho nos usuários, eles podem dar grandes idéias para melhorar seu produto. E nem sempre isso demanda testes complexos, altos investimentos e mudanças de grande porte; análise de estatísticas, observação atenta ao uso natural que se faz do site podem indicar as mudanças necessárias. Pequenos ajustes podem facilitar muito a vida de quem usa seu site!
Clorisval Júnior deixou um link curioso nos comentários de um post anterior. Jealous Computers, uma campanha da Nokia que pretende posicionar um de seus mais recentes aparelhos (Nokia N95) em um novo patamar na evolução dos computadores. Não por acaso, eles evitam chamar este aparelho de “telefone celular”, preferindo usar o termo “multimedia computer”.
Por trás da divertida campanha, uma discussão interessante sobre o futuro dos computadores. Há quem acredite que a tendência é que no futuro os aparelhos agreguem cada vez mais funções. Seguindo essa linha de raciocínio, muitos apostam nos telefones celulares como plataforma mais provável para o desenvolvimento dos computadores do futuro. É bom lembrar que mesmo em países com uma enorme quantidade de pessoas com baixa renda como o Brasil, o telefone celular é usado por grande parte da população. O hábito de usar o telefone já é uma realidade, o celular é um aparelho familiar para muitos. Uma vez que na atualidade a “cibercultura” valoriza cada vez mais a mobilidade, leveza, acesso à rede, conexão a todo momento, o telefone celular parece realmente um caminho interessante para o desenvolvimento futuro dos computadores.
Mas uma coisa é ter o aparelho. Outra é saber usá-lo. Não há como garantir que as pessoas venham a usar seus telefones como computadores, que venham a usar todas as funções disponíveis (Internet via celular, câmera de video/foto, agenda telefônica, SMS, MMS etc.) plenamente. Até o momento ainda é preciso manipular telas, menus, interfaces diversas…os telefones ainda são complicados de usar. Creio que mesmo o iPhone da Apple, que de fato é um pequeno computador, dificilmente será usado plenamente por pessoas pouco familiarizadas com sistemas operacionais, apesar da excelência da Apple em design de interação. É provável que a maioria dos leitores desse blog não tenha qualquer dificuldade em desvendar os mistérios das interfaces do iPhone (ou do Nokia N95), mas o cidadão “comum” em geral não tem tanta familiaridade em navegar em sistemas operacionais, limitando-se na maioria das vezes a repetir operações aprendidas com alguma dificuldade. Qualquer coisa fora do roteiro é motivo de stress e insegurança. Para muitos, os celulares “multimedia computers” não passarão de telefones. Pequenos e notáveis computadores, usados somente para receber e fazer ligações telefônicas.
A analogia que mais me agrada nessa história dos telefones / multimedia computers é a do canivete suiço. O canivete suíço clássico contém diversas “ferramentas”, parece uma solução ótima para todos os problemas. Mas quando precisamos de fato usá-las, elas não passam de “quebra-galho”, arremedos das ferramentas que pretendem substituir. Por melhor e por mais prático que seja ter tantas opções reunidas em um único aparelho, nada substitui a ferramenta desenhada especialmente para um fim específico. E é por isso que todos temos uma tesoura “de verdade”, um saca-rolhas “de verdade”, uma chave de fenda “de verdade”, ao invés de termos somente um canivete suíço. Este acaba funcionando em situações nas quais não podemos levar as ferramentas conosco, optando pela versão modesta do canivete, que no final das contas nem sempre resolve o problema.

É um telefone ou um canivete suíço?
E aí que entra a segunda vertente para o futuro dos computadores. É uma vertente pouco falada, porque interessa pouco comercialmente – ou melhor, os grandes conglomerados que estão por trás da indústria de telefonia celular e de computadores em geral não se interessam por esse caminho. A idéia é muito simples: ao invés de um aparelho com N funções, N aparelhos com funções específicas, mas facilmente integrados e compartilhando dados e informações. Assim teríamos aparelhos com interfaces mais simples, porque seriam feitos especificamente para uma função.
Essa vertente tem raízes na “calm technology”, uma tecnologia que demanda pouco esforço cognitivo. Uma tecnologia que de tão simples a gente nem percebe que está usando.
É uma idéia antiga. O artigo Designing Calm Technology, de Mark Weiser e John Seely Brown é uma boa introdução a esse conceito.
Particularmente, sou favorável a essa idéia. Mas tem muita gente que aposta no caminho inverso. Especialmente as pessoas ligadas às empresas de telefonia celular. Até o momento, o que eu vejo no mercado são computadores de bolso ruins de usar, ou telefones celulares que acabaram ficando complicados sem necessidade.
Mas, o futuro é sempre inesperado e é cada vez mais dominado pelo que é melhor para as empresas, e não para as pessoas.
É possível que venhamos todos a usar canivetes suíços.