O computador sumiu!
O projeto de sites é um campo de atuação relativamente conhecido atualmente e que, apesar da constante evolução da Web, não parece ter sofrido grandes mudanças estruturais da década de 90 para cá. O número de usuários da Internet no Brasil cresce a cada ano, as tecnologias por trás do desenvolvimento dos sites têm evoluído, novos canais de distribuição de conteúdo aparecem, assim como novos contextos de acesso. Apesar disso, o cotidiano de quem trabalha com projetos para a Web mudou pouco e muitos profissionais desse mercado ainda não perceberam o que o futuro lhes reserva.
Os telefones celulares de 3ª geração, praticamente computadores de bolso, são uma pista do que vem por aí. Não me refiro somente ao fato do computador ter “encolhido”, mas sim às novas possibilidades de acesso e consumo de informação, em contextos muito distintos daqueles que pautaram o design para a Web até então. A mobilidade altera sensivelmente nossas práticas atuais de acesso à Internet, normalmente restritas ao escritório, ou às nossas casas. Nesses contextos estamos sempre “presos” a um computador que delimita um ambiente e uma situação de uso. Os notebooks, embora permitam maior mobilidade, ainda são basicamente o mesmo paradigma de computador que conhecemos. Mas isso deve se alterar num futuro não muito distante. Os computadores vão “desaparecer”.
Calma. É melhor explicar direito. Os computadores vão “desaparecer” não pela sua ausência, mas exatamente pela sua multiplicação. É chegado o tempo da ubiqüidade computacional: os computadores não serão necessariamente “caixotes” com monitores grandes, teclado e mouse. Os objetos mais corriqueiros poderão ter algum dispositivo computacional: nossas roupas, as paredes de nossas casas, nossos telefones, nossos porta-retratos, nossos carros. Não somente teremos sistemas computadorizados em diversos objetos, mas eles poderão receber e transmitir dados, percebendo mudanças de estado e condições do ambiente, e tomar decisões em função dessas informações. Os objetos passarão a ter uma “inteligência” própria e a atuar de maneira discreta, sem demandar nossa atenção. Os computadores estarão integrados ao nosso ambiente, sem qualquer semelhança com os PCs que usamos hoje em dia.
Esse cenário futurista não é novo. Desde a década de 80 uma área da ciência da computação, chamada Ubiquitous Computing, dedica-se a fazer dessa visão realidade. Os avanços tecnológicos mais recentes tornam essa idéia cada vez mais concreta: a redução dos componentes computacionais parece seguir o princípio da lei de Moore, os dispositivos digitais são cada vez menores e com maior capacidade de processamento, podendo ser aplicados a diferentes objetos; o desenvolvimento da nanotecnologia também promete ampliar os horizontes para a criação de materiais e objetos capazes de captar informações do ambiente, assim como exibir dados em superfícies flexíveis. Além disso, o aprimoramento das tecnologias de transmissão de dados em redes sem fio, os sistemas de rastreamento por satélite, a utilização de etiquetas de identificação por rádio-freqüência (RFID tags) e a implementação do protocolo IPv6 , abrem perspectivas para a identificação e localização de objetos nunca vistas anteriormente. Num futuro não muito distante, qualquer objeto poderá ter uma identidade digital única, sendo possível rastreá-lo e localizá-lo, eventualmente obtendo dados de seu estado e do seu entorno a partir da comunicação remota com este objeto. Ao mesmo tempo, as pesquisas sobre Web Semântica prometem facilitar a utilização de sistemas de informação, que passariam a operar de maneira mais independente e inteligente, realizando associações e inferências baseadas em meta-informações. Pode-se dizer que a infra-estrutura básica para a concretização do cenário de ubiqüidade computacional nunca esteve tão próxima da ideal.
Esta nova etapa da computação traz questões importantes para o campo da interação humano-computador. Já não basta pensar em computação móvel, mas em ambientes de conexão e interação constante, que nem sempre dependem da ação direta de um indivíduo para acontecer. Em tese estaríamos a caminho de um mundo no qual os computadores demandariam menor esforço cognitivo para sua utilização. Nesse contexto, é fundamental pensarmos em como facilitar o acesso e a compreensão de uma quantidade cada vez maior de informações, difusas no ambiente.
Embora no Brasil essa discussão ainda seja incipiente, em muitos países já há pesquisas sobre interfaces que possam tornar o ambiente um sistema de informações amigável. Essa combinação de objetos inteligentes com o design de informação chama-se Ambient Information Systems. Os projetos nesse campo vão desde copos que mudam de textura em função da temperatura dos líquidos que contém para prevenir queimaduras (Dynamic Textures), fontes de água que mudam a intensidade de vazão de acordo com as variações do mercado financeiro, propiciando uma visão rápida e intuitiva da movimentação da bolsa de valores (Data Fountain), e guarda-chuvas que “avisam” quando há probabilidade de chuva ou neve emitindo sinais luminosos de seu cabo (Ambient Umbrella).
O paradigma de interfaces Web é definitivamente limitado para dar conta dos novos meios de exibição de informações, em contextos de ubiqüidade computacional. Para aqueles que atualmente se dedicam ao projeto da experiência de uso de sistemas de informação, há muito o que fazer e, principalmente, muito o que pesquisar!
4 de novembro de 2008