Sinalização e Ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo

Vítor Angelo Ferreira
Mauro Pinheiro
Rodrigo Resende
Renato Wanick
Elton Vinícius Silva


Resumo

Apresenta o desenvolvimento do projeto de sinalização e ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo. Descreve os métodos utilizados na etapa exploratória, a saber: observação assistemática do ambiente, entrevistas semi-estruturadas com a população de usuários, entrevistas semi-estruturadas com funcionários, grupo de foco com a direção do referido órgão; Após a análise dos dados, descreve as linhas de ação que orientaram o projeto: revitalização da imagem institucional, e ambientação e sinalização propriamente ditas. Conclui destacando a importância de um processo estruturado de pesquisa durante a fase de levantamento de dados, e a importância de facilitar o acesso às informações e tornar o ambiente adequado a indivíduos com necessidades especiais de locomoção.

Introdução

O surgimento de cursos de pós-graduação e a conseqüente formação de mestres e doutores em Design no país, têm promovido a aproximação cada vez mais freqüente dos profissionais dessa área com a prática de pesquisa. No entanto, ainda são poucos os designers que têm conciliado o desenvolvimento de projetos com atividades de pesquisa, desperdiçando informações preciosas que estas poderiam fornecer. Além disso, a despeito do crescente número de profissionais, o país ainda conta com uma tímida contribuição dos designers no que diz respeito à melhoria da qualidade de vida da população, uma vez que os benefícios da atividade desses profissionais ainda se encontram restritos a uma elite que pode consumir os bens culturais e de consumo resultantes de sua atuação.

É curioso que mais de 30 anos depois da primeira publicação de Design for the Real World, os alertas de Papanek (2000) ainda sejam extremamente atuais. Tendo em vista a necessidade de sobrevivência dos profissionais de Design, é natural que sua atenção esteja voltada para resolução de problemas de empresas mais interessadas em aprimorar seus produtos e aumentar as vendas, do que promover o bem estar efetivo ou minimizar os problemas sociais do país, sabidamente inúmeros. Nesse contexto, a Universidade Pública parece ser o berço natural para projetos com preocupações sociais, desvinculada por sua própria natureza com a satisfação de elites e grupos econômicos. Esse ambiente é propício para a harmonia entre teoria e prática, entre pesquisa e desenvolvimento, tendo a melhoria da qualidade de vida do povo como meta.

Este artigo descreve o desenvolvimento do projeto de sinalização e ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo, destacando os métodos de pesquisa utilizados. Acredita-se que o projeto promoverá melhorias para os usuários da instituição, além de garantir acessibilidade para indivíduos portadores de necessidades especiais de locomoção. A oportunidade de desenvolver um projeto dessa natureza é fundamental, tendo em vista o papel social do Design, muitas vezes esquecido em meio aos discursos contaminados por estratégias de publicidade, marketing e vendas, aos quais constantemente os escritórios e profissionais de Design têm se limitado.

Contexto do projeto

A Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) é o órgão responsável por diversos procedimentos relativos à graduação, como matrícula de alunos, transferência de curso, trancamento e destrancamento de matrícula, confecção e registro de diplomas, colação de grau em datas especiais etc. É o órgão da universidade mais diretamente ligado aos alunos e à coordenação dos cursos, sendo fundamental na manutenção da estrutura acadêmica. Dada a abrangência de suas atividades, ao longo da vida universitária os alunos recorrem à Prograd diversas vezes.

A partir do contato da Prograd com a empresa júnior do curso de Desenho Industrial, Phocus Design, surgiu a oportunidade de desenvolver um projeto de sinalização e ambientação de seu espaço físico.

Métodos utilizados

O projeto foi estruturado em quatro fases: levantamento de dados e problematização; análise e sistematização dos dados; desenvolvimento; implantação. As fases são descritas a seguir.

Levantamento de dados e problematização

Para realização do projeto, era fundamental compreender o funcionamento da Prograd. Essa compreensão foi construída a partir do diálogo com os principais atores daquele universo: os usuários, que solicitam serviços e informações; os funcionários, que executam tais serviços, lidando diretamente com os usuários; a direção da Pró-Reitoria, que tem a visão estratégica do órgão e interage com instâncias administrativas diversas da universidade.

Cada um destes atores tem um papel distinto na constituição da realidade institucional da Prograd. Enquanto a direção está mais próxima do papel de idealizador da identidade da instituição, os funcionários são em parte responsáveis por transmitir esses valores. Essa transmissão ocorre, dentre outros meios, pelo contato com os usuários. Do conjunto de impressões e formas de contato que estes últimos têm com a instituição, passam a constituir para si uma imagem da Prograd (conforme Chaves, 1990), que muitas vezes difere daquela pretendida pela direção da instituição.

Para que fosse possível compreender o que Chaves denomina “dimensões da atividade institucional”, era necessário uma imersão no universo da instituição e um contato maior com os atores envolvidos no cotidiano da Prograd. Esse levantamento foi feito por meio de:

A observação assistemática foi o método escolhido para ter um primeiro contato com a realidade da instituição. Sendo uma técnica geralmente utilizada em estudos exploratórios, permitiu aos pesquisadores “identificar e obter provas a respeito de objetivos sobre os quais os indivíduos não têm consciência, mas que orientam seu comportamento” (LAKATOS, 1996, p.79).

Levantadas as primeiras hipóteses sobre possíveis problemas percebidos, era necessário confirmar ou refutar as impressões iniciais com a população envolvida. Passamos à realização de entrevistas semi-estruturadas, por entender que esta técnica traria resultados mais abrangentes e espontâneos, permitindo ainda maior rapidez de resultados. De acordo com Boni e Quaresma (2005, p.75), “a principal vantagem da entrevista aberta e também da semi-estruturada é que essas duas técnicas quase sempre produzem uma melhor amostra da população de interesse.(…), além disso, a interação entre o entrevistador e o entrevistado favorece as respostas espontâneas”.

Foram realizadas 122 entrevistas, ao longo de três dias. Nessa fase foram entrevistados alunos dos diversos cursos da UFES, escolhidos aleatoriamente. Os pesquisadores foram a campo, abordando os alunos no próprio campus ou em locais próximos (como o ponto de ônibus de uma das saídas do campus).

Tendo ouvido os principais usuários, restava saber como a própria instituição enxergava a si própria e quais as questões que poderiam ser melhoradas no seu trabalho. Para tanto, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os funcionários e com a direção, separadamente. Foram realizadas entrevistas com 15 funcionários, ao longo de dois dias. A direção do Pró-Reitoria foi entrevistada em dois momentos distintos, inicialmente através de um grupo de foco (ou grupo focal), com participação de quatro membros da direção da Prograd, e num segundo momento foi feita uma entrevista semi-estruturada com o Diretor do Departamento de Desenvolvimento Pedagógico, sendo este o principal interlocutor da Prograd com o grupo que realizou o projeto. A segunda entrevista aprofundou e esclareceu questões levantadas no grupo focal.

Por último, os pesquisadores foram a campo observar instituições semelhantes e soluções de projeto desenvolvidas para sinalização e ambientação destes espaços, de maneira a ampliar o conhecimento sobre o universo de trabalho. A idéia era encontrar uma solução que fosse considerada excelente para servir como benchmark. No entanto, não foram encontradas soluções que pudessem ser classificadas como tal, sendo essa etapa pouco relevante para o desenvolvimento do projeto.

Análise e sistematização dos dados

A partir das entrevistas com os usuários, pode-se perceber que os alunos mais antigos apresentavam um pré-julgamento pejorativo quanto à Prograd. No entanto, quando confrontados com perguntas mais específicas, foi possível perceber que não havia motivos sólidos para tal julgamento. Acredita-se que a imagem da instituição esteja desgastada por experiências anteriores frustradas ou casos isolados que terminaram por criar uma imagem pior do que a realidade institucional efetivamente se apresenta. Outro indicativo dessa suposição foi o fato da maioria dos usuários cujo único contato com a Prograd tenha se dado na 1ª matrícula (matrícula dos calouros), mostrarem-se satisfeitos com o atendimento. Se por um lado poderia se inferir que o processo de matrícula funciona bem, sendo um evento sazonal, por outro acredita-se que os calouros não tenham sido “contaminados” pela idéia de que os órgãos da universidade não funcionam, conforme percebido na fala dos alunos mais antigos.

As entrevistas com os funcionários apontaram diversos problemas de natureza operacional da instituição, muitos dos quais poderiam ser solucionados através da sinalização e do redesenho do espaço, oferecendo canais alternativos de informação. Muitas vezes as pessoas encaminhavam-se à Prograd com dúvidas que poderiam ser resolvidas sem necessidade de atendimento, desde que a informação estivesse disponível em outro canal. No entanto, na situação analisada, os funcionários tornavam-se o principal meio de informação, o que acarretava filas para o atendimento e demora na prestação de serviços – uma vez que os funcionários que fazem atendimento, também realizam os serviços solicitados. Soma-se a esse fato o desconhecimento por parte dos usuários dos serviços oferecidos e documentos necessários para o atendimento. Por vezes os usuários solicitavam serviços que não eram prestados pela Prograd, e sim por outras instâncias da universidade. Outro ponto percebido foi a dificuldade de comunicação gerada pela configuração dos guichês, que tornavam o contato entre usuários e funcionários precário e não levava em consideração pessoas com necessidades especiais de locomoção.

O grupo de foco realizado com a direção foi fundamental para o entendimento dos processos e da realidade institucional. No entanto, foi na dinâmica entre os usuários e os funcionários que se concentraram as ações do projeto. A observação assistemática do ambiente também trouxe informações preciosas que não foram detectadas nas entrevistas.

A partir da análise dos dados, algumas diretrizes de projeto foram traçadas. Parte delas visava à melhoria do ambiente, tornando o contato com a Prograd mais agradável, especialmente em situações de espera por atendimento. O projeto deveria criar novos meios de acesso às informações, reduzindo o contato com os funcionários, com conseqüente diminuição do tempo de espera para o atendimento e aumento da agilidade na realização dos serviços. Outra diretriz fundamental era adequar o ambiente às pessoas com necessidades especiais de locomoção. A partir dessa ações, esperava-se melhorar a imagem da instituição.
As recomendações posteriores à análise seguem listadas abaixo:

Desenvolvimento

Definidas as diretrizes do projeto, passou-se ao desenvolvimento. Essa etapa foi subdividida em:

O projeto arquitetônico buscou o melhor aproveitamento de espaço, resolvendo parte dos problemas levantados, propondo: alteração da altura e desenho dos guichês; criação de um setor de informações, para a triagem dos atendimentos; instalação de um setor de auto-atendimento, no qual alguns serviços podem ser feitos por micros ligados à Internet; rebaixamento do teto e novo projeto de iluminação, tornando o ambiente mais claro; redesenho dos banheiros e acessos, tornando o espaço adequado aos usuários com necessidades especiais de locomoção; ampliação dos espaços para painéis de informações;

Planta baixa com as alterações projetadas, destacadas em vermelho
Planta baixa com as alterações projetadas, destacadas em vermelho

O projeto de identidade visual foi desenvolvido com duas intenções. Na ausência de um programa de identidade visual para a Prograd, buscou-se uma identidade para a sinalização que conferisse unidade às peças desenvolvidas, fortalecendo a noção de um sistema de elementos que interagiam entre si, e que servisse como um marco do processo de melhoria dos serviços vivido pela instituição, sendo a própria instauração de um projeto de sinalização, parte desse processo. Cabe ressaltar que não se pretendia desenvolver um programa completo de identidade visual para a instituição, uma vez que isso demandaria um trabalho mais extenso do que o previsto inicialmente.

O projeto de sinalização apresentava as informações mais requisitadas, através de painéis aplicados diretamente no salão principal, com a descrição dos processos mais freqüentes, documentos necessários para a execução dos serviços, calendário de eventos etc. Mock-ups em escala 1:1 foram aplicados no local para testar a legibilidade, compreensão dos textos e circulação das pessoas para a leitura dos painéis.

ANTES: Entrada da Prograd
ANTES: Entrada da Prograd

DEPOIS: Entrada da Prograd

DEPOIS: Entrada da Prograd
DEPOIS: Entrada da Prograd. Trabalhou-se com a idéia do marco arquitetônico, como forma de destacar e valorizar o prédio da Prograd no contexto da UFES. Visando à melhoria do ambiente interno, a iluminação e climatização foram revistas. Informações sobre o funcionamento da Prograd foram colocadas no lado externo, para orientar os passantes.

logo da Prograd
Foi definida uma paleta de cores e desenvolvida uma assinatura tipográfica para o projeto. O sistema trabalha com a variação de caixa alta e baixa para destacar unidades semânticas.

ANTES: balcão de atendimento
ANTES: balcão de atendimento

DEPOIS: salão de espera e balcão de informações.
DEPOIS: salão de espera e balcão de informações. A utilização de cadeiras e senhas eletrônicas para organizar o atendimento visa a eliminar a idéia de fila, associada a lentidão e ineficiência. Além disso, o acesso facilitado às informações, dispostas em painéis pelo salão, pretende reduzir o número de atendimentos no balcão.

DEPOIS: salão de espera e balcão de informações.
DEPOIS: balcão de atendimento. A altura dos balcões foi revista, para que pessoas em cadeiras de rodas pudessem ser atendidas sem problemas.

ANTES: área interna
ANTES: área interna

DEPOIS: área interna.
DEPOIS: área interna. Muitos dos problemas percebidos eram de desinformação sobre os procedimentos realizados pela Prograd. O projeto buscou tornar acessíveis as informações mais requisitadas e também o calendário acadêmico corrente, aproveitando o espaço interno do salão.

Conclusão

O trabalho apresentado é um exemplo de como técnicas de pesquisa das ciências sociais podem trazer informações valiosas para o desenvolvimento de projetos no campo do Design. A aproximação dos designers com a pesquisa acadêmica tende a enriquecer enormemente os resultados de sua atividade projetual. A partir desse projeto, realizado com um grupo de alunos sob orientação de um professor do curso de Design, espera-se promover a melhoria dos usuários da Pró-Reitoria de Graduação da UFES. Os beneficiados são diversos: em primeiro lugar, a própria instituição, uma vez que a melhoria proporcionada pelo projeto agilizará os processos e reduzirá os custos humanos no que se refere ao atendimento ao usuário. Além disso, o projeto associará uma nova imagem à Prograd, resgatando o valor de sua atuação na esfera universitária. Outros beneficiados serão os próprios alunos da UFES, uma vez que terão maior facilidade de acesso a informações que hoje se concentram nas mãos dos funcionários da Prograd.

É importante destacar ainda a preocupação em tornar a instituição acessível a indivíduos com necessidades especiais de locomoção, em sintonia com as diretrizes da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação. Acessibilidade é um direito e uma necessidade para que todos possam exercer suas atividades sem restrições.

Em uma época na qual os designers vêem-se comprometidos com metas de produtividade e aumento de vendas, é fundamental resgatar o valor social do design, de maneira que os profissionais possam atuar cada vez mais no sentido de promover melhorias na vida das pessoas. A despeito do alerta feito por Papanek (2000) há mais de 30 anos, parece que pouco tem sido feito no campo do Design nesse sentido. A Universidade parece ser o local ideal para que projetos dessa natureza floresçam.

Referências

BONI,Valdete; QUARESMA, Sílvia Jurema. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em Ciências. Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC, Vol. 2 nº 1 (3), p.68-80, jan.-jul./2005. Disponível em http://www.emtese.ufsc.br/3_art5.pdf Último acesso em 17 de março de 2006.

CHAVES, Norberto. La imagen corporativa: teoria y metodologia de la identificación institucional. 2a. ed. Barcelona: Gustavo Gili, 1990.

FOLLIS, John; HAMMER, Dave. Architectural signing and graphics. Londres: Whitney Library of Design, Watson-Guphill Publications, The Architectural Press, 1979.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Técnicas de pesquisa. 3a. edição. São Paulo: Editora Atlas, 1996.

PAPANEK, Victor. Design for the real world: human ecology and social change. 2ª ed. Chicago: Academy Chicago Publishers, 2000.

Referência para este artigo:

PINHEIRO, Mauro; FERREIRA, Vítor Angelo; RESENDE, Rodrigo; WANICK, Renato; SILVA, Elton Vinícius. Sinalização e ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo. In: Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design (P&D Design), 7., 2006, Curitiba. Anais…CD-ROM. Curitiba, 2006.

9 de agosto de 2006








Sinalização e Ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo

Vítor Angelo Ferreira
Mauro Pinheiro
Rodrigo Resende
Renato Wanick
Elton Vinícius Silva


Resumo

Apresenta o desenvolvimento do projeto de sinalização e ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo. Descreve os métodos utilizados na etapa exploratória, a saber: observação assistemática do ambiente, entrevistas semi-estruturadas com a população de usuários, entrevistas semi-estruturadas com funcionários, grupo de foco com a direção do referido órgão; Após a análise dos dados, descreve as linhas de ação que orientaram o projeto: revitalização da imagem institucional, e ambientação e sinalização propriamente ditas. Conclui destacando a importância de um processo estruturado de pesquisa durante a fase de levantamento de dados, e a importância de facilitar o acesso às informações e tornar o ambiente adequado a indivíduos com necessidades especiais de locomoção.

Introdução

O surgimento de cursos de pós-graduação e a conseqüente formação de mestres e doutores em Design no país, têm promovido a aproximação cada vez mais freqüente dos profissionais dessa área com a prática de pesquisa. No entanto, ainda são poucos os designers que têm conciliado o desenvolvimento de projetos com atividades de pesquisa, desperdiçando informações preciosas que estas poderiam fornecer. Além disso, a despeito do crescente número de profissionais, o país ainda conta com uma tímida contribuição dos designers no que diz respeito à melhoria da qualidade de vida da população, uma vez que os benefícios da atividade desses profissionais ainda se encontram restritos a uma elite que pode consumir os bens culturais e de consumo resultantes de sua atuação.

É curioso que mais de 30 anos depois da primeira publicação de Design for the Real World, os alertas de Papanek (2000) ainda sejam extremamente atuais. Tendo em vista a necessidade de sobrevivência dos profissionais de Design, é natural que sua atenção esteja voltada para resolução de problemas de empresas mais interessadas em aprimorar seus produtos e aumentar as vendas, do que promover o bem estar efetivo ou minimizar os problemas sociais do país, sabidamente inúmeros. Nesse contexto, a Universidade Pública parece ser o berço natural para projetos com preocupações sociais, desvinculada por sua própria natureza com a satisfação de elites e grupos econômicos. Esse ambiente é propício para a harmonia entre teoria e prática, entre pesquisa e desenvolvimento, tendo a melhoria da qualidade de vida do povo como meta.

Este artigo descreve o desenvolvimento do projeto de sinalização e ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo, destacando os métodos de pesquisa utilizados. Acredita-se que o projeto promoverá melhorias para os usuários da instituição, além de garantir acessibilidade para indivíduos portadores de necessidades especiais de locomoção. A oportunidade de desenvolver um projeto dessa natureza é fundamental, tendo em vista o papel social do Design, muitas vezes esquecido em meio aos discursos contaminados por estratégias de publicidade, marketing e vendas, aos quais constantemente os escritórios e profissionais de Design têm se limitado.

Contexto do projeto

A Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) é o órgão responsável por diversos procedimentos relativos à graduação, como matrícula de alunos, transferência de curso, trancamento e destrancamento de matrícula, confecção e registro de diplomas, colação de grau em datas especiais etc. É o órgão da universidade mais diretamente ligado aos alunos e à coordenação dos cursos, sendo fundamental na manutenção da estrutura acadêmica. Dada a abrangência de suas atividades, ao longo da vida universitária os alunos recorrem à Prograd diversas vezes.

A partir do contato da Prograd com a empresa júnior do curso de Desenho Industrial, Phocus Design, surgiu a oportunidade de desenvolver um projeto de sinalização e ambientação de seu espaço físico.

Métodos utilizados

O projeto foi estruturado em quatro fases: levantamento de dados e problematização; análise e sistematização dos dados; desenvolvimento; implantação. As fases são descritas a seguir.

Levantamento de dados e problematização

Para realização do projeto, era fundamental compreender o funcionamento da Prograd. Essa compreensão foi construída a partir do diálogo com os principais atores daquele universo: os usuários, que solicitam serviços e informações; os funcionários, que executam tais serviços, lidando diretamente com os usuários; a direção da Pró-Reitoria, que tem a visão estratégica do órgão e interage com instâncias administrativas diversas da universidade.

Cada um destes atores tem um papel distinto na constituição da realidade institucional da Prograd. Enquanto a direção está mais próxima do papel de idealizador da identidade da instituição, os funcionários são em parte responsáveis por transmitir esses valores. Essa transmissão ocorre, dentre outros meios, pelo contato com os usuários. Do conjunto de impressões e formas de contato que estes últimos têm com a instituição, passam a constituir para si uma imagem da Prograd (conforme Chaves, 1990), que muitas vezes difere daquela pretendida pela direção da instituição.

Para que fosse possível compreender o que Chaves denomina “dimensões da atividade institucional”, era necessário uma imersão no universo da instituição e um contato maior com os atores envolvidos no cotidiano da Prograd. Esse levantamento foi feito por meio de:

A observação assistemática foi o método escolhido para ter um primeiro contato com a realidade da instituição. Sendo uma técnica geralmente utilizada em estudos exploratórios, permitiu aos pesquisadores “identificar e obter provas a respeito de objetivos sobre os quais os indivíduos não têm consciência, mas que orientam seu comportamento” (LAKATOS, 1996, p.79).

Levantadas as primeiras hipóteses sobre possíveis problemas percebidos, era necessário confirmar ou refutar as impressões iniciais com a população envolvida. Passamos à realização de entrevistas semi-estruturadas, por entender que esta técnica traria resultados mais abrangentes e espontâneos, permitindo ainda maior rapidez de resultados. De acordo com Boni e Quaresma (2005, p.75), “a principal vantagem da entrevista aberta e também da semi-estruturada é que essas duas técnicas quase sempre produzem uma melhor amostra da população de interesse.(…), além disso, a interação entre o entrevistador e o entrevistado favorece as respostas espontâneas”.

Foram realizadas 122 entrevistas, ao longo de três dias. Nessa fase foram entrevistados alunos dos diversos cursos da UFES, escolhidos aleatoriamente. Os pesquisadores foram a campo, abordando os alunos no próprio campus ou em locais próximos (como o ponto de ônibus de uma das saídas do campus).

Tendo ouvido os principais usuários, restava saber como a própria instituição enxergava a si própria e quais as questões que poderiam ser melhoradas no seu trabalho. Para tanto, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os funcionários e com a direção, separadamente. Foram realizadas entrevistas com 15 funcionários, ao longo de dois dias. A direção do Pró-Reitoria foi entrevistada em dois momentos distintos, inicialmente através de um grupo de foco (ou grupo focal), com participação de quatro membros da direção da Prograd, e num segundo momento foi feita uma entrevista semi-estruturada com o Diretor do Departamento de Desenvolvimento Pedagógico, sendo este o principal interlocutor da Prograd com o grupo que realizou o projeto. A segunda entrevista aprofundou e esclareceu questões levantadas no grupo focal.

Por último, os pesquisadores foram a campo observar instituições semelhantes e soluções de projeto desenvolvidas para sinalização e ambientação destes espaços, de maneira a ampliar o conhecimento sobre o universo de trabalho. A idéia era encontrar uma solução que fosse considerada excelente para servir como benchmark. No entanto, não foram encontradas soluções que pudessem ser classificadas como tal, sendo essa etapa pouco relevante para o desenvolvimento do projeto.

Análise e sistematização dos dados

A partir das entrevistas com os usuários, pode-se perceber que os alunos mais antigos apresentavam um pré-julgamento pejorativo quanto à Prograd. No entanto, quando confrontados com perguntas mais específicas, foi possível perceber que não havia motivos sólidos para tal julgamento. Acredita-se que a imagem da instituição esteja desgastada por experiências anteriores frustradas ou casos isolados que terminaram por criar uma imagem pior do que a realidade institucional efetivamente se apresenta. Outro indicativo dessa suposição foi o fato da maioria dos usuários cujo único contato com a Prograd tenha se dado na 1ª matrícula (matrícula dos calouros), mostrarem-se satisfeitos com o atendimento. Se por um lado poderia se inferir que o processo de matrícula funciona bem, sendo um evento sazonal, por outro acredita-se que os calouros não tenham sido “contaminados” pela idéia de que os órgãos da universidade não funcionam, conforme percebido na fala dos alunos mais antigos.

As entrevistas com os funcionários apontaram diversos problemas de natureza operacional da instituição, muitos dos quais poderiam ser solucionados através da sinalização e do redesenho do espaço, oferecendo canais alternativos de informação. Muitas vezes as pessoas encaminhavam-se à Prograd com dúvidas que poderiam ser resolvidas sem necessidade de atendimento, desde que a informação estivesse disponível em outro canal. No entanto, na situação analisada, os funcionários tornavam-se o principal meio de informação, o que acarretava filas para o atendimento e demora na prestação de serviços – uma vez que os funcionários que fazem atendimento, também realizam os serviços solicitados. Soma-se a esse fato o desconhecimento por parte dos usuários dos serviços oferecidos e documentos necessários para o atendimento. Por vezes os usuários solicitavam serviços que não eram prestados pela Prograd, e sim por outras instâncias da universidade. Outro ponto percebido foi a dificuldade de comunicação gerada pela configuração dos guichês, que tornavam o contato entre usuários e funcionários precário e não levava em consideração pessoas com necessidades especiais de locomoção.

O grupo de foco realizado com a direção foi fundamental para o entendimento dos processos e da realidade institucional. No entanto, foi na dinâmica entre os usuários e os funcionários que se concentraram as ações do projeto. A observação assistemática do ambiente também trouxe informações preciosas que não foram detectadas nas entrevistas.

A partir da análise dos dados, algumas diretrizes de projeto foram traçadas. Parte delas visava à melhoria do ambiente, tornando o contato com a Prograd mais agradável, especialmente em situações de espera por atendimento. O projeto deveria criar novos meios de acesso às informações, reduzindo o contato com os funcionários, com conseqüente diminuição do tempo de espera para o atendimento e aumento da agilidade na realização dos serviços. Outra diretriz fundamental era adequar o ambiente às pessoas com necessidades especiais de locomoção. A partir dessa ações, esperava-se melhorar a imagem da instituição.
As recomendações posteriores à análise seguem listadas abaixo:

Desenvolvimento

Definidas as diretrizes do projeto, passou-se ao desenvolvimento. Essa etapa foi subdividida em:

O projeto arquitetônico buscou o melhor aproveitamento de espaço, resolvendo parte dos problemas levantados, propondo: alteração da altura e desenho dos guichês; criação de um setor de informações, para a triagem dos atendimentos; instalação de um setor de auto-atendimento, no qual alguns serviços podem ser feitos por micros ligados à Internet; rebaixamento do teto e novo projeto de iluminação, tornando o ambiente mais claro; redesenho dos banheiros e acessos, tornando o espaço adequado aos usuários com necessidades especiais de locomoção; ampliação dos espaços para painéis de informações;

Planta baixa com as alterações projetadas, destacadas em vermelho
Planta baixa com as alterações projetadas, destacadas em vermelho

O projeto de identidade visual foi desenvolvido com duas intenções. Na ausência de um programa de identidade visual para a Prograd, buscou-se uma identidade para a sinalização que conferisse unidade às peças desenvolvidas, fortalecendo a noção de um sistema de elementos que interagiam entre si, e que servisse como um marco do processo de melhoria dos serviços vivido pela instituição, sendo a própria instauração de um projeto de sinalização, parte desse processo. Cabe ressaltar que não se pretendia desenvolver um programa completo de identidade visual para a instituição, uma vez que isso demandaria um trabalho mais extenso do que o previsto inicialmente.

O projeto de sinalização apresentava as informações mais requisitadas, através de painéis aplicados diretamente no salão principal, com a descrição dos processos mais freqüentes, documentos necessários para a execução dos serviços, calendário de eventos etc. Mock-ups em escala 1:1 foram aplicados no local para testar a legibilidade, compreensão dos textos e circulação das pessoas para a leitura dos painéis.

ANTES: Entrada da Prograd
ANTES: Entrada da Prograd

DEPOIS: Entrada da Prograd

DEPOIS: Entrada da Prograd
DEPOIS: Entrada da Prograd. Trabalhou-se com a idéia do marco arquitetônico, como forma de destacar e valorizar o prédio da Prograd no contexto da UFES. Visando à melhoria do ambiente interno, a iluminação e climatização foram revistas. Informações sobre o funcionamento da Prograd foram colocadas no lado externo, para orientar os passantes.

logo da Prograd
Foi definida uma paleta de cores e desenvolvida uma assinatura tipográfica para o projeto. O sistema trabalha com a variação de caixa alta e baixa para destacar unidades semânticas.

ANTES: balcão de atendimento
ANTES: balcão de atendimento

DEPOIS: salão de espera e balcão de informações.
DEPOIS: salão de espera e balcão de informações. A utilização de cadeiras e senhas eletrônicas para organizar o atendimento visa a eliminar a idéia de fila, associada a lentidão e ineficiência. Além disso, o acesso facilitado às informações, dispostas em painéis pelo salão, pretende reduzir o número de atendimentos no balcão.

DEPOIS: salão de espera e balcão de informações.
DEPOIS: balcão de atendimento. A altura dos balcões foi revista, para que pessoas em cadeiras de rodas pudessem ser atendidas sem problemas.

ANTES: área interna
ANTES: área interna

DEPOIS: área interna.
DEPOIS: área interna. Muitos dos problemas percebidos eram de desinformação sobre os procedimentos realizados pela Prograd. O projeto buscou tornar acessíveis as informações mais requisitadas e também o calendário acadêmico corrente, aproveitando o espaço interno do salão.

Conclusão

O trabalho apresentado é um exemplo de como técnicas de pesquisa das ciências sociais podem trazer informações valiosas para o desenvolvimento de projetos no campo do Design. A aproximação dos designers com a pesquisa acadêmica tende a enriquecer enormemente os resultados de sua atividade projetual. A partir desse projeto, realizado com um grupo de alunos sob orientação de um professor do curso de Design, espera-se promover a melhoria dos usuários da Pró-Reitoria de Graduação da UFES. Os beneficiados são diversos: em primeiro lugar, a própria instituição, uma vez que a melhoria proporcionada pelo projeto agilizará os processos e reduzirá os custos humanos no que se refere ao atendimento ao usuário. Além disso, o projeto associará uma nova imagem à Prograd, resgatando o valor de sua atuação na esfera universitária. Outros beneficiados serão os próprios alunos da UFES, uma vez que terão maior facilidade de acesso a informações que hoje se concentram nas mãos dos funcionários da Prograd.

É importante destacar ainda a preocupação em tornar a instituição acessível a indivíduos com necessidades especiais de locomoção, em sintonia com as diretrizes da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação. Acessibilidade é um direito e uma necessidade para que todos possam exercer suas atividades sem restrições.

Em uma época na qual os designers vêem-se comprometidos com metas de produtividade e aumento de vendas, é fundamental resgatar o valor social do design, de maneira que os profissionais possam atuar cada vez mais no sentido de promover melhorias na vida das pessoas. A despeito do alerta feito por Papanek (2000) há mais de 30 anos, parece que pouco tem sido feito no campo do Design nesse sentido. A Universidade parece ser o local ideal para que projetos dessa natureza floresçam.

Referências

BONI,Valdete; QUARESMA, Sílvia Jurema. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em Ciências. Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC, Vol. 2 nº 1 (3), p.68-80, jan.-jul./2005. Disponível em http://www.emtese.ufsc.br/3_art5.pdf Último acesso em 17 de março de 2006.

CHAVES, Norberto. La imagen corporativa: teoria y metodologia de la identificación institucional. 2a. ed. Barcelona: Gustavo Gili, 1990.

FOLLIS, John; HAMMER, Dave. Architectural signing and graphics. Londres: Whitney Library of Design, Watson-Guphill Publications, The Architectural Press, 1979.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Técnicas de pesquisa. 3a. edição. São Paulo: Editora Atlas, 1996.

PAPANEK, Victor. Design for the real world: human ecology and social change. 2ª ed. Chicago: Academy Chicago Publishers, 2000.

Referência para este artigo:

PINHEIRO, Mauro; FERREIRA, Vítor Angelo; RESENDE, Rodrigo; WANICK, Renato; SILVA, Elton Vinícius. Sinalização e ambientação da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo. In: Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design (P&D Design), 7., 2006, Curitiba. Anais…CD-ROM. Curitiba, 2006.

9 de agosto de 2006