28 de abril, 2000

Redesignando a WWW: o papel do design na democratização da World Wide Web

3 · O papel do design na democratização da WWW

Neste capítulo procuramos destacar a situação de exclusão que vem sendo imposta àqueles que não compartilham do repertório simbólico dos grupos que têm estado à frente do desenvolvimento da World Wide Web. Vimos que a democratização da Internet depende fundamentalmente do acesso público à infra-estrutura que suporta a rede; entretanto, existe uma questão anterior ao simples acesso à base tecnológica da Internet. Qualquer discussão acerca do alcance limitado da chamada revolução informacional deve levar em conta os aspectos cognitivos subjacentes à própria utilização da rede. Para que a Internet possa vir a ser utilizada por qualquer pessoa, é necessário ter em mente que a capacidade de interpretação dos códigos constituintes da linguagem da WWW não se dá da mesma maneira nos diversos grupos sócio-culturais que deveriam estar participando da sociedade da informação. Mais do que garantir o acesso aos meios tecnológicos, democratizar a Internet implica rever o modelo cognitivo adotado no desenvolvimento da rede. Se a questão do acesso ao aparato tecnológico insere-se basicamente na esfera política e econômica, a questão comunicacional, cognitiva, faz parte do universo do design.

A solução adotada para organizar a informação na World Wide Web teve origem no meio acadêmico, refletindo assim uma lógica muito particular, típica daquele universo. A informação era organizada então em páginas, documentos que poderiam se relacionar dinamicamente através dos recursos de hipertexto. Essa forma de organizar os assuntos assemelhava-se com a maneira mais comum de armazenar o conhecimento até então – o livro. As analogias que se estabeleceram inicialmente entre o livro e a WWW seguem um movimento natural dos meios de comunicação; quando ocorre o surgimento de uma nova mídia, há um período de descoberta das características e possibilidades singulares do veículo. Até que se compreenda e desenvolva um repertório, uma linguagem que explore à exaustão as possibilidades expressivas da nova mídia, é comum a utilização de conceitos e padrões que sejam mais familiares aos usuários, oriundos de experiências anteriores. Na época do surgimento da televisão, o rádio era a grande referência em termos de veículo de comunicação, e os primeiros programas televisivos utilizavam muito da linguagem do rádio, embora fossem mídias completamente distintas, demandando tratamentos diferenciados da informação. Foi necessário um período de experimentação, de adaptação até que se entendesse qual o repertório exclusivo da TV para que surgisse uma linguagem singular, que utilizasse os recursos técnicos e comunicacionais de maneira eficiente. Hoje é possível perceber claramente a diferença de enfoques do tratamento e da veiculação da informação em ambos os veículos.

Da mesma forma, a World Wide Web trouxe consigo uma linguagem singular, diferente de todos os veículos de comunicação conhecidos até então. Se inicialmente o livro foi a referência mais próxima, muito se deve ao fato da web ter se originado especificamente para a divulgação de pesquisas científicas, de documentos produzidos no meio acadêmico. Além disso, havia a limitação tecnológica da transmissão de dados pelo sistema telefônico; na época em que a World Wide Web dava seus primeiros passos, a multimídia já havia conquistado seu espaço como ferramenta de armazenamento e veiculação de informação, mas como a WWW teve seu surgimento atrelado à infra-estrutura de redes da Internet, transmitindo portanto quantidades reduzidas de dados por telefone, havia pouca possibilidade de utilização dos recursos multimídia, já que os dados de som e imagem típicos dessa linguagem demandariam uma capacidade de transferência muito maior do que o que era viável com a tecnologia disponível naquele momento. Na verdade, para o universo restrito no qual era utilizada, a WWW atendia muito bem seus objetivos, mesmo contando com poucos recursos no que se refere à forma de organizar e apresentar a informação. Com a abertura da rede para o mercado comercial, ocorreu uma atualização da WWW; a produção e veiculação da informação tomaram outro sentido, implicando um tratamento diverso do que vinha sendo feito até então. As inovações tecnológicas ampliaram o leque de possibilidades e enriqueceram o repertório simbólico – as referências passaram a ser expressas com uma diversidade de símbolos muito maior.

É interessante perceber o impulso que o uso comercial da Internet proporcionou, tanto no que se refere à sua própria expansão quanto ao desenvolvimento de uma linguagem específica para a World Wide Web. A utilização para fins comerciais ampliou o alcance da rede para além do restrito meio acadêmico, e a partir daí o crescimento do número de usuários observado nesse veículo vem ocorrendo em menor tempo do que qualquer outro em toda a história das comunicações – enquanto o rádio levou 38 anos para atingir 50 milhões de usuários e a televisão levou 13 anos, a Internet levou apenas 4 anos para alcançar o mesmo número de pessoas . Apesar do potencial comunicacional inerente ao veículo, cada vez mais a rede assume um caráter comercial, com uma verdadeira explosão de empresas ligadas à rede, e esse crescente contingente de usuários vem utilizando o veículo, na maioria das vezes, apenas como uma ferramenta útil para realizar negócios, compras ou qualquer atividade ligada ao comércio. Seria ingênuo encarar tal atitude como mero acaso.

O crescimento do número de internautas foi acompanhado por uma evolução no design da interface da WWW, incorporando cada vez mais as inovações tecnológicas e permitindo uma diversificação na forma, na maneira como a informação é apresentada ao usuário. Paulatinamente foi sendo constituída uma linguagem específica da Internet, desenvolvida e apreendida simultaneamente, mais pela sistematização do uso de alguns padrões estabelecidos em consonância com as especificidades do grupo dominante, do que pela pesquisa no sentido de desenvolver soluções que explorassem as novas possibilidades cognitivas inerentes ao veículo. A organização dos dados na WWW segue uma lógica cartesiana típica das culturas ocidentais, ou melhor, de determinados segmentos desse universo que tomaram a frente no desenvolvimento e disseminação desse veículo, cuja visão de mundo é fortemente influenciada pela doutrina de Descartes. A organização da informação na World Wide Web dá-se de forma hierarquizada, segmentada, incompleta e restritiva. Aqueles que conseguem operar esse sistema necessariamente dominam, em maior ou menor grau, uma lógica que lhes permite constituir uma aparente ‘totalidade’ a partir da ligação dos vários elementos dispersos no ciberespaço, conectando mentalmente ‘bits’ de informação, tecendo uma rede de relações através de links e subseqüentes saltos entre os hiperdocumentos disponíveis na WWW. A evolução da rede, e a conseqüente institucionalização dessa visão cartesiana como o parâmetro básico para seu desenvolvimento, vêm tornando cada vez mais necessário o domínio de um raciocínio lógico para o uso eficiente do sistema. Pode-se imaginar que aqueles que não vêem o mundo com as mesmas lentes ordenadoras dificilmente participarão de igual para igual na sociedade da informação, como explicitado por Spitz:

Criada a partir de parâmetros estabelecidos em países desenvolvidos, e voltada para atender primordialmente às necessidades de determinados grupos de usuários pertencentes a esses contextos, a tecnologia computacional está hoje impregnada de vieses e valores do mundo ocidental desenvolvido, embutidos em sua arquitetura, interfaces e linguagens. Segundo Streibel (1986), muitos fatores concorrem para o predomínio de determinados códigos culturais na computação. Ele enfatiza que, por se constituírem numa tecnologia que manipula dados e símbolos de acordo com regras sintáticas e formais, computadores tendem a legitimizar os conhecimentos que se adequam a essa estrutura, e a tornar ilegítimos outros tipos de conhecimento, tais como a interpretação, a intuição e a introspecção. Para o autor, a computação nos impõe uma postura de agentes de previsão, de cálculo e controle, ainda que sejamos sujeitos ativos, construtivos e intuitivos em nossa abordagem com relação ao mundo.

A expansão do uso de computadores nos países em desenvolvimento – em paralelo aos resultados de pesquisas que nos revelam dramáticos indicadores sociais de pobreza, miséria, marginalidade e violência – demanda uma análise criteriosa das especificidades sócio-culturais dos diferentes contextos e discussões sobre seus efeitos nessas sociedades econômica e tecnologicamente menos favorecidas. (Spitz, 1999:116)

Resta perguntar, de que maneira o design poderá contribuir para reverter ou ao menos minimizar esse quadro, como abrandar os impactos que a implantação da tecnologia computacional, a institucionalização do uso da Internet na maioria das atividades do próximo século poderá causar em nossa sociedade. Seria possível promover a alteração da base tecnológica computacional, questionando sua arquitetura, seu funcionamento, e mesmo a própria lógica intrínseca a essa tecnologia? Embora o debate dessas questões seja desejável, parece pouco provável que a discussão, limitada a esse nível, possa expandir-se além do campo das idéias, do debate acadêmico, distanciando-se de uma aplicação prática. De qualquer modo, são questões mais afeitas à área tecnológica da informática, campo em que o design tem pouca ou nenhuma inserção. Nesse caso, qual seria o caminho a ser percorrido que possibilitasse resultados práticos, a curto prazo, onde o design poderia influir de maneira efetiva?

Levando-se em conta que a maioria dos sistemas computacionais utilizados hoje em dia valem-se de interfaces gráficas no processo comunicacional com o usuário, e considerando-se que o projeto dessas interfaces insere-se na esfera de ação do design, o desenvolvimento de interfaces gráficas que contemplem as especificidades de diferentes sujeitos emerge como resposta àquela questão. Se todo o sistema no qual a WWW se apoia reflete uma lógica típica dos grupos dominantes que vêm guiando a evolução desse veículo, cabe ao design criar dispositivos que permitam a tradução para contextos diversos, através da reformulação das interfaces utilizadas. Não se trata de reformular por completo a base tecnológica atual; ao contrário, deve-se tirar partido da criatividade inerente ao design, para formular novas interfaces valendo-se dos recursos disponíveis atualmente; baseado nas diversas manifestações culturais, tendo em mente que existem sujeitos com diferentes níveis cognitivos, diferentes visões de mundo além do modelo cartesiano, o design deverá trabalhar na perspectiva de traduzir as informações de um formato para outro, como sugerido por Spitz:

[…] para que se estabeleça uma efetiva comunicação entre dois sujeitos, não é preciso que eles pensem ou ajam de maneira igual ou homogênea. É preciso apenas o estabelecimento de regras e símbolos – e de uma norma de tradução – que contemple seus diferentes mundos e significados, com interesse e respeito mútuos. Talvez resida aí a chave para uma verdadeira e completa comunicação humana. (Spitz, ibid:122)

Dentro dessa perspectiva, é interessante analisar de que maneira o design vem atuando no desenvolvimento da WWW. Se inicialmente a interface da World Wide Web resultou principalmente do trabalho dos técnicos em informática que desenvolveram o sistema, com o passar do tempo os designers começaram a tomar para si a tarefa de definir a forma, a aparência da grande rede – seja no que se refere ao tratamento gráfico dado à informação, seja na maneira de organizar, estruturar hierarquicamente o conteúdo e pensar as diversas possibilidades de ‘navegação’ e acesso aos dados pelo usuário. Entretanto, apesar do design de sites ter ganhado importância ao longo do tempo, o desenvolvimento da interface na web ainda não é uma atividade exclusiva do campo de conhecimento do design. Dada a própria facilidade de disponibilizar documentos na rede, qualquer usuário com acesso às ferramentas necessárias pode desenvolver seu web site, mesmo que não domine o corpo teórico relativo à comunicação visual, o que poderia capacitá-lo a desenvolver páginas com uma solução mais eficiente do ponto de vista comunicacional. No Brasil, mesmo nas empresas que atualmente trabalham com desenvolvimento de sites para Internet, o papel do designer ainda não está claramente definido, como atesta Zambelli (1999). A autora afirma que um corpo de conhecimento advindo da experiência de fazer web design parece ter se formado nestes últimos anos, mas a insistente referência à mídia impressa pelas pessoas que atualmente vêm desenvolvendo web sites, denota que o conhecimento relativo à nova mídia ainda é limitado. Os parâmetros para o desenvolvimento dos sites estão calcados, muitas vezes, na exploração das inovações tecnológicas, e esse ‘deslumbramento tecnológico’ tende a mascarar as principais riquezas da mídia. Zambelli considera que as possibilidades de interação do usuário com a informação, a estrutura não linear de consulta ao conteúdo, a possibilidade de acesso à informação em tempo real e a capacidade de atualização contínua do conteúdo são questões fundamentais a serem levadas em consideração no desenvolvimento de qualquer projeto de interface para World Wide Web. Entretanto essas questões vêm sendo exploradas timidamente pela maioria das pessoas que trabalha com web design. O que se vê é a repetição à exaustão de modelos consolidados pelo senso comum como soluções adequadas às necessidades dos usuários típicos, o que não significa que sejam as melhores alternativas de projeto, principalmente se levarmos em consideração o fato de que esses modelos geralmente vêm sendo aplicados indistintamente em contextos culturais diversos. Uma rede que, ao menos teoricamente, pretende ter alcance global, deveria ser igualmente acessível para pessoas que sequer dominam o saber formal, as técnicas de leitura e escrita; no entanto parece pouco provável que um projeto desenvolvido para um fim específico, visando um usuário de determinado contexto, com referências particulares a seu ambiente, funcione da mesma maneira quando introduzido em outra situação, junto a um público com características e níveis cognitivos tão diferentes. Essa questão não parece ter sido relevada e a implantação de um modelo único tem sido a constante observada na World Wide Web.

Essa discussão envolve também o papel hegemônico de determinados segmentos da sociedade norte-americana na grande rede; tendo sido o berço do surgimento da Internet, maior incentivador de seu uso e de realização de pesquisas nessa área, os Estados Unidos lideram as estatísticas relativas ao uso da rede, seja no que se refere ao número absoluto de usuários – 110 milhões – seja na relação entre usuários e a população total – 41% da população é usuária da rede – seja no número de domínios registrados naquele país – mais de 32 milhões – seja no uso de computadores – os Estados Unidos têm mais computadores do que o restante dos países do mundo combinados – ou ainda na participação daquele país na Internet – mais de 50% dos usuários da rede estão localizados nos EUA, país que abriga menos de 5% da população mundial . Não por acaso a maioria dos sites disponíveis na rede hoje em dia está localizada nos Estados Unidos (45% do total de domínios registrados no mundo todo), implicando as soluções de projeto de interface desse universo refletirem a cultura norte-americana. Como a rede permite o acesso indiscriminado a esse material, é comum que pessoas de diferentes países, com outras referências culturais estejam utilizando o sistema desenvolvido originalmente de acordo com os padrões cognitivos do cidadão norte-americano. Entretanto, durante a implantação da rede em outros países percebe-se a inadequação da utilização desse modelo em outros contextos; o desenvolvimento da Internet nos países periféricos vem desconsiderando as singularidades de seus usuários, quando se deveria buscar soluções próprias para as questões comunicacionais típicas desses países, baseadas nos aspectos cognitivos de seus povos, e não a mera repetição de um modelo estabelecido por uma cultura dominante, que certamente não se adequa à realidade dos países que vem entrando tardiamente no ciberespaço. Se a presença maciça da cultura norte-americana na rede impôs um padrão no que diz respeito ao desenvolvimento da interface da WWW, há que se pensar alternativas de projeto que contemplem as especificidades dos diferentes usuários que estão iniciando sua entrada no ciberespaço, ou ainda, que terão suas vidas modificadas com a inserção da Internet em diversos níveis da vida pública na sociedade contemporânea. Sem a discussão de novos caminhos para o desenvolvimento da Internet, dificilmente esses sujeitos terão uma participação ativa na rede, e poderão mesmo permanecer à margem da ‘sociedade da informação’.

Os responsáveis pela criação dos sites parecem crer que a cópia do modelo americano é a melhor alternativa no que se refere ao design das páginas web, ao invés de procurarem soluções originais, baseadas nas demandas específicas da população que majoritariamente irá utilizar seus serviços. A globalização do final de século segue a lógica da implantação de um modelo único em detrimento das características regionais, fenômeno este que pode ser observado em diferentes esferas, da economia à moda, do comportamento à política. Da mesma forma, o design de páginas web no Brasil vem sendo sistematicamente mera repetição de esquemas forjados nos países do ‘primeiro mundo’, os ‘colonizadores’ do ciberespaço. Embora exista um sentimento de reação a esse modelo de globalização, uma busca da reafirmação da identidade local – o que pode ser percebido no recrudescimento das guerras regionais, principalmente no leste europeu, e pelas dificuldades enfrentadas na implantação efetiva do Mercado Comum Europeu, por exemplo – no que se refere ao desenvolvimento da WWW pouco parece ter sido discutido no sentido de estimular o desenvolvimento de linguagens específicas, projetos que se baseiem não em modelos importados, mas sim em demandas e características singulares dos possíveis usuários, que poderiam definir um ‘dialeto’, um repertório regional a ser considerado no desenvolvimento de interfaces para World Wide Web. É possível argumentar que as pessoas que estão usando a Internet estejam familiarizadas com a linguagem que surge na América do Norte, e se mantém ainda hoje como a referência em termos do que há de mais atual na grande rede. Vale lembrar que a Internet está presente sobretudo nos grandes centros urbanos do país, onde a cultura norte-americana está difundida de forma intensa, na programação de televisão, na produção cinematográfica, na moda, na propaganda, etc. Dessa forma, a assimilação de uma linguagem exógena parece se inserir num contexto maior de aculturação que já vem ocorrendo há muito tempo, de maneira muito mais profunda do que uma análise superficial poderia levar a crer.

Segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa para Desenvolvimento das Nações Unidas de 1999, o fluxo de cultura e produção cultural se intensificou de maneira acentuada na última década, mas apenas em um sentido – dos países ricos para os países pobres. O relatório afirma ainda que a indústria responsável pelos maiores índices de exportação dos Estados Unidos não é a de automobilismo, computadores ou aviões, mas sim a de entretenimento. A cultura norte-americana está cada vez mais presente nos meios de comunicação em todo o mundo, muitas vezes em detrimento do desenvolvimento da expressão cultural local; a produção de Hollywood é responsável por 70% do mercado de cinema na Europa, 83% na América Latina e 50% no Japão. De toda programação de televisão latino-americana, 62% tem origem nos Estados Unidos, 30% refere-se a produção local e 8% vem da Europa, Ásia e outros continentes. No que se refere à Internet, o quadro não é menos alarmante: 80% dos web sites disponíveis na rede são escritos na língua inglesa, embora estatisticamente menos de uma pessoa em cada 10 fale essa língua em todo o mundo. Tendo em vista esse cenário, não parece errado afirmar que a Internet foi construída privilegiando os saberes e códigos específicos de um determinado grupo social. As pessoas que hoje navegam na rede compartilham, em certa medida, o mesmo repertório que o cidadão médio norte-americano. Obviamente isso não quer dizer que o brasileiro que hoje usa a Internet é culturalmente semelhante ao americano, uma vez que a cultura pode ser entendida como uma rede de significados, construída a partir de diversas variáveis (Velho, 1981). Mas sem dúvida existe um plano comum onde indivíduos de culturas distintas encontram pontos de ligação; o que é preocupante é que no Brasil esse grupo restrito parece querer cada vez mais espelhar-se numa cultura exógena, como se os saberes que irradiam dos grandes centros econômicos fossem mais ricos do que os saberes locais – o que sem dúvida acrescenta muito pouco àqueles que hoje encontram-se à margem desse processo mas que serão diretamente afetados no futuro, mesmo que permaneçam fora da rede.

A cópia do modelo é incongruente com uma idéia de superação dos problemas locais, por constituir-se numa solução particular para um dado contexto, não devendo ser generalizada ou tomada como referência, como destacado por Bonsiepe, quando trata da necessidade da reflexão sobre uma atividade de design especificamente voltada para a realidade dos países de economia periférica:

Considerados os distintos contextos históricos, a Periferia pouco tem a aprender com o Centro, e o Centro pouco tem a ensinar à Periferia. Não duvido, porém, que o nível técnico alcançado no Centro irradie intensa fascinação sobre a sensibilidade visual e tátil da Periferia. Duvido sim de sua validez na Periferia, além da estreita camada social que está empenhada na caça ao modelo central. (Bonsiepe, 1983:7)

Se desejamos a participação da população em geral na ‘sociedade da informação’ de forma plena, é preciso ter em mente outro universo de usuários do que o restrito contingente dos grandes centros urbanos que partilham patrimônios culturais (Velho, 1980) com povos estrangeiros. Levando em conta o processo ora em curso de disseminação da Internet, a difusão da tecnologia para além dos guetos onde hoje se concentra a maioria dos internautas, é necessário ter uma perspectiva mais ampla do que seja um projeto de interface para World Wide Web que permita o entendimento da informação disponibilizada por qualquer cidadão, tendo em vista os diferentes repertórios dos diversos grupos sociais que poderão inserir-se nas malhas da rede. Além disso, é preciso ter em mente que a participação plena implica acesso não somente à informação, mas também aos meios de produção e veiculação de dados na Internet. Não basta garantir que qualquer cidadão tenha condições de buscar a informação, é preciso incentivar e viabilizar a participação de forma plena, produzindo e compartilhando informações, entrelaçando histórias e construindo uma narrativa coletiva, condição fundamental para a inserção do homem na discussão da sua realidade social, seu contexto histórico, na formação da cidadania (Freire, 1980).

A aplicação de modelos que desconsideram o contexto cultural onde serão aplicados ignora as diferentes formas de leitura possíveis de uma mesma realidade, a compreensão singular de cada ser humano sobre um mesmo assunto. Em um país como o Brasil, que apresenta uma complexidade cultural tão grande quanto sua extensão territorial, e que ainda hoje, apresenta um índice de analfabetismo acentuado, certamente a utilização da WWW deveria seguir orientações diversas. Parece pouco provável que uma pessoa morando na cidade de São Paulo tenha a mesma visão de mundo, expectativas e demandas culturais que um morador de uma aldeia indígena Guarani, um cidadão analfabeto que cumpre pena em um presídio do Rio de Janeiro , ou de um camponês do interior do Mato Grosso do Sul, e conseqüentemente, o sistema simbólico utilizado no processo comunicacional de cada um destes usuários deveria ser considerado no projeto de interface, de maneira a privilegiar o seu entendimento e possibilitar a utilização plena do instrumento informático. Se os usuários brasileiros de Internet hoje operam com razoável facilidade na rede, deve-se muito ao fato de constituírem um grupo semelhante aos ‘colonizadores’ do ciberespaço. Mas o Brasil de maneira geral é constituído de diversos grupos sociais que operam segundo lógicas diferentes; os moradores dos centros urbanos – a grande maioria da comunidade internauta brasileira – não podem ser tomados como parâmetro por constituírem uma porção reduzida da população, que hoje está mais afeita ao modo de vida e padrões culturais do estrangeiro. Devemos trabalhar com essa perspectiva, a existência de diferenças marcantes dentro do mesmo território, como já destacava Aloisio Magalhães em 1977:

É preciso atentarmos para o fato de que nesta segunda metade do século XX os conceitos de desenvolvimento sócio-econômico e das relações entre países de economia centralizadora e economia periférica necessitam ser revistos. Neste caso, nossa posição de domínio do Desenho Industrial pode oferecer, através da ótica abrangente que o modelo nos proporcionou, condições de reconceituar a própria natureza da atividade que nasceu voltada apenas para a solução de problemas emergentes da relação tecnologia/usuário em contextos altamente desenvolvidos, a bitola estreita da relação produto/usuário nas sociedades eminentemente de consumo.

Aqui, a natureza contrastada e desigual do processo de desenvolvimento gera problemas naquela relação, que exigem um posicionamento de latitude extremamente amplas; a consciência da modéstia de nossos recursos para a amplitude do espaço territorial; a responsabilidade ética de diminuir o contraste entre pequenas áreas altamente concentradas de riquezas e benefícios e grandes áreas rarefeitas e pobres. Nestas é poderosa apenas a riqueza latente de autenticidade e originalidade da cultura brasileira. Naquelas a carência de originalidade deu lugar à exuberante presença da cópia e o gosto mimético por outros valores culturais. (Magalhães, 1998: 11).

É preciso ter em mente que não se pretende criar apenas um novo modelo para WWW, uma mera substituição de um padrão por outro. É necessário que o design atue no sentido de criar alternativas baseadas nos saberes locais, nas especificidades de cada grupo social, permitindo assim que a rede tenha um alcance maior do que hoje em dia efetivamente possui. O design parece ser a ferramenta fundamental para a criação dessa WWW ‘camaleônica’, adaptável a diferentes contextos e repertórios, por operar simultaneamente com variáveis tecnológicas e culturais, que permitiriam a compreensão das limitações técnicas e as especificidades e demandas de grupos sociais diversos. A própria natureza da atividade indica uma vocação para unir a técnica à diversidade cultural, como já destacava Magalhães:

Aos fatores econômicos privilegiados até bem pouco foram acrescentados os fatores sociais e, já agora, a compreensão do todo cultural. O Desenho Industrial surge naturalmente como uma disciplina capaz de se responsabilizar por uma parte significativa deste processo. Porque não dispondo nem detendo um saber próprio, utiliza vários saberes; procura sobretudo compatibilizar de um lado aqueles saberes que se ocupam da racionalização e da medida exata – os que dizem respeito à ciência e à tecnologia – e de outro, daqueles que auscultam a vocação e a aspiração dos indivíduos – os que compõem o conjunto das ciências humanas. (Magalhães, ibid:12).

Originalidade e autenticidade são fatores importantes a serem observados em uma revisão da World Wide Web. O processo de desenvolvimento de uma web que leve em conta as diferenças sócio-culturais, diferentes estágios cognitivos, deve seguir os princípios do que Bonsiepe chama de tecnologia apropriada. A tecnologia apropriada “se caracteriza por uma concepção segundo a qual o homem é sujeito do processo tecnológico, e não objeto passivo, condenado aos ‘imperativos neutros’ do avanço científico e tecnológico, manejado por um grupo reduzido de especialistas (mandarinismo tecnológico). Dirige-se contra o gigantismo tecnológico, contra os assépticos especialistas idiotizados, contra o elitismo tecnológico.” (Bonsiepe, 1983:164). Um projeto que busque uma WWW realmente democrática, deve valer-se da participação efetiva dos grupos de possíveis usuários quando na elaboração da interface, caso contrário estaremos apenas substituindo um modelo importado por nossos próprios modelos pré-concebidos, com grandes chances de não obtermos resultados satisfatórios. Como afirmava Papanek, o processo projetual é muito importante para ser deixado a cargo apenas do designer:

[…] uma equipe de design não é abrangente o suficiente se for apenas interdisciplinar. É preciso que se incluam também alguns dos possíveis usuários. (Papanek, 1983:32) (tradução nossa)

Parece clara a responsabilidade social do design como ferramenta, numa perspectiva de ação que procure mudar os rumos do desenvolvimento da rede. Essa discussão leva ao próprio repensar da prática projetual no Brasil, tendo em vista o contexto atual, onde a atividade parece estar mais alinhada com os mecanismos instituídos pelo neoliberalismo em seu fomento à globalização, da forma como esta vem ocorrendo hoje – orientada principalmente pela expansão dos mercados, incentivando a pesquisa de novas formas de estímulo ao consumo de objetos supérfluos, ao invés da satisfação das necessidades básicas do homem, da diminuição da pobreza, do desenvolvimento sustentável.

A globalização que assistimos parece mais uma estratégia de garantir a implementação do ‘modelo único’, minimizando as identidades locais, criando mecanismos de dependência – econômica, cultural, tecnológica – dos países periféricos em relação ao centro irradiador desta política, promovendo uma nova versão do imperialismo, como registra com humor o cartunista Jaílson.

figura 02

De que maneira o design se insere nesse contexto, qual o seu papel em tempos de ‘globalização’? O design pode de fato ter uma atuação que procure fortalecer a identidade nacional, as especificidades de nossa cultura, a busca de um modelo alternativo de desenvolvimento que não siga as regras da cartilha globalizante?

Se o discurso moderno “acreditou na industrialização como alternativa válida para o desenvolvimento social em geral” (Pereira de Souza, 1998:8), nos dias de hoje percebe-se que o incentivo à produção industrial pouco contribuiu para minimizar as desigualdades sociais, que dirá promover o desenvolvimento na perspectiva democrática que pretendiam os designers modernos. Esse discurso atualizou-se em um modelo de desenvolvimento que Margolin chama de ‘modelo de expansão’, segundo o qual a inovação e o desenvolvimento de produtos são a força motriz da economia global:

Trata-se, porém, de um raciocínio dominado essencialmente pela fé no poder da inovação tecnológica para enriquecer a experiência humana. A relação entre produtos e experiência se pauta na convicção de que os bens materiais são capazes de prover uma satisfação ilimitada.

O materialismo tem se tornado parte tão integrante das noções de felicidade que o desenvolvimento de produtos encontra-se emaranhado de forma quase inextricável à busca de melhoramento da vida humana. (Margolin, 1998:42)

Essa visão tem levado ao fortalecimento da produção e consumo de bens de ‘necessidade programada’, cuja função última seria, dentro dessa concepção, o ‘enriquecimento da experiência humana’. A ‘necessidade’ de consumo de uma gama cada vez maior de produtos insere-se em um movimento cuidadosamente engendrado pelo sistema capitalista que parece antes favorecer o empobrecimento da experiência, como Benjamin (1994) já alertara anteriormente.

O modelo expansionista, evidenciado por Margolin, tem criado cada vez mais ‘necessidades’ ou ‘desejos’, como previsto por Papanek décadas antes:

[…] [o Design] atualmente tem satisfeito apenas desejos e necessidades efêmeras, enquanto as necessidades reais do homem têm sido constantemente negligenciadas pelo designer. As necessidades econômicas, psicológicas, espirituais, tecnológicas e intelectuais da humanidade são geralmente mais difíceis e menos lucrativas de satisfazer do que os cuidadosamente planejados e manipulados ‘desejos’ incutidos pelo capricho e pela moda. (Papanek, 1974:24) (tradução nossa)

O grande problema é quando a criação dessas necessidades implica um monopólio radical, que não deixa às pessoas nenhuma opção a não ser utilizar os produtos criados, caso contrário ficam impossibilitados de operar dentro da sociedade em que vivem. Um exemplo típico nos dias de hoje são as constantes ‘evoluções’ e ‘novas versões’ dos programas de computadores, que surgem a cada ano e nos possibilitam fazer basicamente as mesmas coisas que as versões anteriores. Aqueles que não se atualizam e continuam operando com versões antigas correm o risco de não ter como trocar dados com os sistemas mais recentes. O modelo de expansão privilegia esse tipo de estratégia, e conseqüentemente demanda gastos para produção dessas ‘necessidades programadas’, deixando de investir na solução de problemas prementes que ainda hoje, no início do século XXI, existem de maneira assustadora, principalmente nos países mais pobres.

Esse modelo expansionista vem sendo propagandeado como o caminho de desenvolvimento a ser seguido em escala mundial, e é fundamental questionarmos o papel do design nesse cenário. Pereira de Souza nos pergunta se “numa época em que se vêem as posturas modernizantes como de exclusiva competência dos países chamados de primeiro mundo, o que restaria para os outros senão, novamente, a reprodução pobre e mimética dos padrões das metrópoles, particularmente quando se proclama como única alternativa válida, até mesmo para sobrevivência, a internacionalização das economias?” (Pereira de Souza, 1996: 323). Na verdade não se trata de retomar as discussões acerca da criação de um ‘design nacional’, mas de como o design deve se posicionar hoje frente a um pensamento globalizante, que pretende aniquilar as diferenças e impor o ‘modelo único’. Pereira de Souza acredita que “será nas brechas de seu ‘corredor tecnológico’, como chama [Tomás] Maldonado a todo o aparato instrumental e ideológico por ela [sociedade industrial] construído, que se poderá encontrar algum espaço novo para uma retomada das idéias humanistas” (Pereira de Souza, ibid).

Mesmo que essa brecha exista, se não ocorrer uma reflexão profunda acerca do tipo de design que se pretende fomentar, as oportunidades de transformação passarão ao largo. Quais são os valores caros ao design hoje? Qual o perfil do profissional que a sociedade necessita, que poderia atuar no sentido de reverter esse movimento globalizante que reprime a experiência local, os saberes e singularidades dos diversos grupos sociais? Em sua análise sobre as diversas vertentes de ensino do design, Whiteley (1998) identifica cinco modelos distintos, que refletem enfoques diferentes da relação entre teoria e prática, explicitando visões distintas do papel do design na sociedade. Os cinco modelos de Whiteley são: o designer formalizado, o designer teorizado, o designer politizado, o designer consumista e o designer tecnológico. Vale ressaltar que a redução a cinco modelos não significa que não existam interpenetrações, mas sim uma tentativa de sistematizar características genéricas que observou durante sua prática de ensino. Apesar de se referir especificamente à questões do ensino de design, a conceituação de Whiteley poderia muito bem ser extrapolada para a atuação do profissional no mercado hoje.

O designer formalizado se preocupa mais com as questões formais, técnicas e práticas do design. Não há reflexão teórica, a teoria é vista mesmo como algo negativo, por desviar a atenção da prática projetual, como se teoria e prática mantivessem uma relação dicotômica. Esse pensamento seria derivado do movimento modernista, das reflexões iniciadas na Bauhaus, e essa visão tecnicista do design ainda é muito presente hoje, sobretudo no Brasil.

O designer teorizado parte do princípio oposto; acredita na fusão completa entre teoria e prática. A discussão teórica seria a chave para entender melhor a realidade e operar nela, mas de fato, segundo Whiteley, ocorre uma valorização da teoria de tal maneira que se chega a um grau de abstração extremo, que torna remota uma relação efetiva com questões práticas da profissão.

O designer politizado tem como base uma visão crítica da atuação do profissional na sociedade, muito influenciada pelas idéias do Construtivismo e do Produtivismo russo após 1917, e em 1960 pelos movimentos de contestação de esquerda. Esta vertente do design encontra eco na década de 70 em Papanek e seu célebre ‘Design for the Real World’. Passou pelo green design na década de 80, e atualmente as questões que buscam discutir referem-se a uma ‘ética do design’, criticando o modelo de desenvolvimento econômico baseado no consumo, no obsoletismo planejado, nos produtos fúteis, enxergando o design “como fenômeno ligado visceral e intimamente ao consumo, e portanto, ao sistema social e político do Ocidente moderno” (Whiteley, ibid:67).

O designer consumista é o oposto ao anterior. Dentro deste modelo, tudo se resume ao mercado, colocando o design como indispensável ao progresso, à produção, sem no entanto estabelecer uma reflexão a respeito do tipo de produção e do próprio conceito de progresso que está sendo incentivado, seus impactos sociais e econômicos numa escala global. Uma característica fundamental deste modelo é a inexistência de discussão teórica, pois “não há nenhuma tentativa de transmitir um contexto mais amplo que permita ao aluno desenvolver uma reflexão crítica sobre o papel do designer na sociedade. O modelo se apresenta, portanto, como uma decorrência ‘natural’ das condições de trabalho, prestando-se a uma assimilação fácil e direta.” (Whiteley, ibid:68).

O designer tecnológico é de certa forma uma variante da vertente anterior, uma vez que atribui à tecnologia um caráter seminal para a profissão. A busca pela evolução tecnológica seria a resposta à todos os problemas. Segundo Whiteley, a discussão teórica praticamente inexiste, limitando-se a especulações de caráter técnico – as perguntas são geralmente ‘como?’, e nunca ‘por quê?’ ou ‘para quê?’.

Por fim, Whiteley propõe o desenvolvimento de um novo modelo de ensino – e conseqüentemente, uma nova visão da atividade de design – o modelo do designer valorizado, uma vertente que necessariamente opera tanto com questões práticas quanto teóricas, sem que isso configure uma fusão entre teoria e prática. Com forte caráter questionador, especialmente no que se refere à sociedade de consumo, esse modelo propõe uma valorização da ética, a discussão sobre as necessidades reais da população, sem no entanto constituir-se um movimento utópico, desvinculado de uma realidade factível, prática. Ao contrário, Whiteley propõe que se discuta em profundidade a realidade tal como esta se apresenta hoje, de maneira a possibilitar um posicionamento crítico, pessoal do aluno – e do designer – dentro de uma perspectiva histórica, vinculada necessariamente com a sociedade no seu sentido mais amplo, possibilitando ações concretas, mesmo que pontuais, para alteração da realidade. Ou seja, a formação de um designer holístico, com ampla visão e entendimento do mundo e de sua responsabilidade social nesse contexto.

Precisamos, para o próximo século, de designers criativos, construtivos e de visão independente, que não sejam nem ‘lacaios do sistema capitalista’, nem ideólogos de algum partido ou doutrina e nem ‘geninhos tecnológicos’, mas antes profissionais capazes de desempenhar seu trabalho com conhecimento, inovação, sensibilidade e consciência. Às escolas de design cabe a responsabilidade de fomentar essas qualidades no aluno, e não uma atitude de atender resignadamente às vicissitudes de um sistema consumista obcecado com lucros rápidos e com o curtíssimo prazo. As escolas e faculdades devem satisfações a toda a sociedade e não apenas àquelas empresas que empregam designers diretamente. O designer precisa ser formado para ser verdadeiramente profissional, no sentido em que fala a profissão médica, e para ter consciência de suas obrigações para com a sociedade como um todo e não apenas com os lucros do seu cliente. O designer precisa ser hipocrático, não hipócrita. (Whiteley, ibid:69)

A atuação profissional na perspectiva do modelo do designer valorizado proposto por Whiteley é fundamental, se pretendemos reverter, ou ao menos minimizar, os efeitos negativos do modelo econômico e político institucionalizado pela globalização neste fim de século. As discussões sobre ética e responsabilidade social do design no Brasil, parecem ter se restringido a um período de implantação e afirmação desta atividade, na década de 60, com alguns movimentos isolados nos anos posteriores, sem que o diálogo tivesse evoluído para além do meio acadêmico e interferido de fato na construção do país. Atualmente as discussões no meio profissional refletem antes uma preocupação com a afirmação do designer no mercado, em garantir um espaço dentro do sistema, em estabelecer-se como uma peça fundamental para a própria manutenção do modelo econômico, sem que haja uma reflexão crítica desse modelo. Como atesta Denis, “o designer vem perdendo, ao longo dos últimos anos, o senso do destino coletivo da profissão e vem se retraindo cada vez mais à segurança relativa do seu espaço individual, conformando-se com a marginalização progressiva da profissão em um mundo (leia-se, um mercado) ansioso para se ver livre de ‘ideologias ultrapassadas’, tal qual a ideologia da função social do design que exerceu fascínio tão poderoso sobre o campo desde Ruskin e Morris até Buckminster Fuller e Papanek.” (Denis, 1998:18)

Denis acredita que não faz sentido “ressuscitar o mito do designer como profeta social acima das vicissitudes históricas”, não aprofundando a própria discussão acerca dos efeitos negativos que a manutenção do ‘sistema de objetos’, referido por Baudrillard (1973), tem promovido, o que pode levar a crer que a figura do designer como colaborador na perpetuação da situação atual seja anacrônica. Ao contrário, a revisão da função social do designer faz-se mais necessária do que nunca; a ‘brecha no corredor tecnológico’ aludida por Maldonado só poderá ser explorada de fato, de maneira consciente e consistente, se o design aprofundar essas discussões, caso contrário continuaremos a repetir e perpetuar as deformidades do modelo globalizante, impedindo a manifestação da diversidade, das soluções particulares que nossa cultura poderá trazer para os problemas que enfrentamos.

A World Wide Web, que poderia ter favorecido a participação da sociedade na discussão do modelo de desenvolvimento desejado, a manifestação da cultura de forma plena, a reflexão da realidade social do povo brasileiro, apresenta-se de fato como uma ferramenta de manutenção do sistema, reflexo de uma cultura que se afirma cada vez mais como colonizadora do ciberespaço, dentro de uma lógica imperialista globalizante, e dificilmente será uma ferramenta que irá alterar os rumos do ‘desenvolvimento’. Cabe ao designer, revendo sua própria importância, situando-se como ser histórico em seu tempo, com uma visão ética e crítica do seu papel na sociedade, trabalhar no sentido de propor soluções criativas que permitirão a atualização da WWW como um sistema camaleônico, mutante, acessível a diferentes grupos sociais, com suas diferentes formas de cognição, de maneira que esses indivíduos possam contar a sua história, enriquecendo efetivamente a experiência humana, participando na tentativa de construção de um mundo melhor.

Diante dessas considerações, essa pesquisa propõe-se a analisar uma situação específica, o design de mecanismos de busca da World Wide Web, buscando evidenciar a prevalência de um modelo cognitivo no desenvolvimento da rede, fato que torna praticamente impossível a outros grupos sociais que não partilhem do mesmo repertório simbólico, que baliza a criação das interfaces gráficas da Web, virem a utilizar esse veículo na sua configuração atual. Essa abordagem, embora não esgote a diversidade de temas a serem trabalhados no que se refere à problemática da democratização do uso da Internet, pode servir como ponto de partida para a discussão de estratégias de atuação do designer na proposição de alternativas de projeto para a WWW, no sentido de viabilizar a participação de diferentes culturas na sociedade da informação.

Através da comparação de diferentes mecanismos de busca existentes na rede, buscou-se evidenciar a tendência mimética, a repetição do ‘modelo único’ no desenvolvimento de interfaces para a WWW em diferentes contextos culturais. A partir da análise dos dados, são sugeridas algumas diretrizes que podem ser aplicadas na formulação de alternativas projetuais que privilegiem as características específicas dos usuários do sistema.

3.1 os mecanismos de busca

Os mecanismos de busca são ferramentas cuja importância tem aumentado na proporção do crescimento da própria Internet. É difícil dizer com certeza quantos documentos estão hoje dispostos na rede , mas sem dúvida o volume de dados é tão grande que a busca de determinada informação nesse universo sem a utilização dessas ferramentas seria extremamente complicada. Saber operar esses mecanismos torna-se cada vez mais um requisito básico para a utilização eficiente da Internet, de maneira a explorar todos os seus recursos; fala-se mesmo em uma alfabetização em mídia (media literacy), um estágio de conhecimento no qual o indivíduo deve ser capaz de acessar, analisar, avaliar e produzir comunicação em uma variedade de formas (Trilo, 1997 apud Spitz, 1999). Como afirma Spitz, “para o cidadão da sociedade informacional, já não basta saber ler e escrever, ou ter aprendido algum ofício. É preciso ter acesso à informação, saber buscá-la e encontrá-la, dominar seu uso, organizá-la e entender suas formas de organização, e, sobretudo, utilizá-la apropriada, adequada e eficazmente.” (Spitz, ibid:120). De acordo com o Center for Media Literacy, “a alfabetização (a habilidade de ler e escrever) não é mais suficiente. Todos […] precisam aprender como ‘ler’ as mensagens das imagens (TV, cinemas, anúncios) da mesma forma como precisam saber como ler as palavras em uma página. Uma pessoa alfabetizada em mídia não sabe todas as respostas, mas sabe fazer as perguntas certas: quem criou essa mensagem? Por que? Como e por que escolheu o que incluir e o que deixar de fora da mensagem? Como isso pretendia me influenciar?”. (tradução nossa) Percebe-se que, da mesma forma que a alfabetização tradicional não é simplesmente o domínio das técnicas de leitura e escrita, a alfabetização em mídia vai além do domínio de ferramentas ou equipamentos; trata-se da capacidade de realizar uma leitura crítica das manifestações de cultura num mundo cada vez mais mediado pelas ‘mídias’, na sua maioria, alienantes.

De qualquer maneira, a utilização das ferramentas é de fundamental importância. Nesse sentido, a compreensão de como funcionam os mecanismos de busca é necessária para a utilização eficiente da WWW. Entretanto, no desenvolvimento desses sites não parece ter havido a preocupação em tornar possível o entendimento de seu funcionamento por qualquer pessoa. A interface da quase totalidade das ferramentas de busca existentes repete um padrão que pressupõe o conhecimento de certos códigos, de uma linguagem específica daqueles que navegam regularmente na rede ou têm familiaridade em usar computadores. Essa distância entre aqueles que dominam e os que não dominam os códigos poderia ser minimizada através de um projeto de interface gráfica que levasse em conta os diferentes repertórios simbólicos, as idiossincrasias dos usuários. Cabe ao designer propor soluções que possibilitem a utilização dos meios informáticos por pessoas com diferentes níveis de expertise em computadores.

Os mecanismos de busca, ou search engines, são grandes repositórios de endereços de páginas da WWW, que podem ser consultados e organizados diferentemente. Atualmente existem duas formas básicas de acessar as informações: através de um catálogo temático, e através da busca dinâmica, limitada por parâmetros definidos pelo usuário. No catálogo ou diretório temático, certas categorias são definidas pelos responsáveis pelo site de busca e os endereços são organizados de acordo com essa classificação. Novas referências podem ser incluídas pelos usuários do sistema, que podem inclusive sugerir outras categorias de organização. Tanto as inclusões quanto a criação de novas categorias ficam sujeitas à avaliação dos responsáveis pelo serviço. Na busca dinâmica o usuário solicita ao sistema que apresente uma lista com endereços de documentos que contenham determinada palavra ou grupo de palavras. Nesse tipo de busca, pode-se ainda efetuar uma ‘busca avançada’, utilizando alguns ‘operadores lógicos’ que permitem uma série de combinações entre palavras, limitando mais ainda o universo de resultados possíveis (por exemplo, listar todos os documentos que contenham a expressão ‘escolas de samba’, excetuando aqueles nos quais ocorra a palavra ‘mangueira’). A busca dinâmica (com ou sem a utilização da sua opção ‘avançada’) talvez seja a maneira mais utilizada para procurar documentos na rede. Nessa modalidade, o banco de dados é atualizado automaticamente de tempos em tempos; o sistema faz uma varredura em toda a rede e compila um índice de todos os documentos que encontra, daí sua maior abrangência em relação aos catálogos temáticos, que dependem da inclusão manual de endereços.

Analisamos alguns dos mecanismos de busca mais conhecidos na rede, para tentar perceber quais as soluções de design adotadas para indicar como o usuário deve proceder para efetuar uma busca. Para tanto, algumas categorias de análise foram adotadas:

Essas categorias de análise procuram cobrir as etapas principais que um usuário deve cumprir para efetuar uma busca utilizando essas ferramentas, o que inclui desde o reconhecimento das zonas de interação, a compreensão dos mecanismos que acionam o sistema, até a apresentação e interpretação dos resultados. Essas categorias encerrram os procedimentos básicos cujo entendimento é fundamental para utilização das ferramentas de busca. A análise dos mecanismos foi feita à luz da necessidade de viabilizar o entendimento de seu funcionamento para pessoas com baixa expertise na utilização das tecnologias de telemática.

É importante destacar que as categorias de análise não se restringem aos aspectos formais ligados diretamente ao projeto gráfico dos mecanismos de busca, incluindo questões ligadas à arquitetura da informação, à lógica de navegação e à cognição humana. Dada a atividade multidisciplinar do design, que muitas vezes lida com questões de cunho antropológico, psicológico, assim como aspectos técnicos e formais, especialmente no que se refere à criação de web sites o designer muitas vezes tem sua participação ampliada além do desenvolvimento do projeto gráfico (Zambelli, 1999:211). Nesse sentido, a análise que aqui realizamos não poderia se restringir aos aspectos ligados unicamente ao projeto gráfico, uma vez que o projeto de um web site envolve questões diversas, as quais muitas vezes são equacionadas pelos próprios profissionais de design.

A seleção dos sites procurou elencar as ferramentas reconhecidas internacionalmente, seja por estarem em funcionamento há mais tempo na rede, seja por terem alcançado reconhecimento da comunidade internauta como mecanismos de busca eficientes. Procurou-se ainda selecionar os sites estrangeiros e brasileiros, de maneira que fosse possível comparar as soluções de design das ferramentas locais com as de seus pares internacionais. A seleção dos sites mais representativos foi feita baseada em consultas à revistas e cadernos de jornais especializados em Internet, além de referências nos sites dos provedores de acesso de maior porte do país, que freqüentemente indicam os mecanismos de busca mais conhecidos. Além disso, muitas vezes os próprios sites de busca apontavam outros mecanismos semelhantes existentes na rede, nos quais o internauta poderia procurar a informação que desejasse, no caso desta não encontrar-se catalogada em seus bancos de dados. Nesses casos, dada a referência recorrente à maioria dos sites selecionados previamente, pode-se perceber que a seleção é representativa dos mecanismos de busca mais conhecidos internacionalmente.

A presença quase exclusiva de sites de procedência americana deve-se ao fato de não ter sido possível encontrar mecanismos de busca de outra nacionalidade no estrangeiro. Alguns contatos no exterior foram feitos para tentar identificar mecanismos de busca locais, sem sucesso, com exceção do ‘UruguayTotal’, do Uruguai, e do ‘Sapo’, de Portugal.

Com essa amostragem, tentou-se perceber se de fato existe um padrão comum no projeto dos mecanismos de busca, independente de sua origem, tendo em vista as conseqüências dessa padronização na utilização da rede por pessoas com diferentes referências culturais e níveis de expertise variados.

Inicialmente são descritos os mecanismos de busca selecionados, tendo em vista as categorias de análise elencadas previamente, para num segundo momento proceder uma análise geral dessas ferramentas, evidenciando as semelhanças existentes entre os mecanismos, que permitem perceber a prevalência de um modelo único baseado em um saber formalizado, destacando ainda os pontos que consideramos essenciais para revisão crítica do projeto desses sites, no sentido de permitir que grupos sociais com diferentes repertórios simbólicos possam vir a utilizar as ferramentas de busca.

HOT BOT – http://www.hotbot.com (ver anexo 1)

A página inicial é diagramada em três colunas. A ocupação das colunas e a utilização de cores define duas áreas distintas no sentido vertical, uma central na qual se pode ver o diretório temático, e outra com opções para efetuar um refinamento da busca. No topo da página, em destaque, o logotipo do site e um banner de propaganda, ocupando as três colunas. Vale lembrar que, devido a limitação da visualização das páginas nos monitores dos computadores, o início da página é a área privilegiada de leitura; as informações mais importantes geralmente estão localizadas no início da página, à esquerda.

O mecanismo de busca principal fica localizado abaixo do logotipo, no topo da página, ocupando também as três colunas, numa área destacada pela cor em contraste com o fundo branco. O usuário deve posicionar o ponteiro do mouse sobre o campo situado ao lado das palavras ‘Search Smarter’, apertar o botão do mouse e escrever uma ou mais palavras quaisquer, que serão os parâmetros utilizados pelo sistema para delimitar a busca. Em seguida deve-se acionar a busca clicando na representação gráfica de um botão onde se lê a palavra ’search’. O acionamento da busca dá-se tanto pelo ato de clicar o botão ‘search’ quanto pelo acionamento da tecla ‘Enter’ no teclado do computador, e esse procedimento é comum à maioria dos mecanismos de busca existentes.

Na página inicial, na coluna esquerda, o usuário pode restringir a busca usando algumas opções de busca avançada. Entretanto, ainda é possível restringir mais ainda a busca, clicando no botão ‘advanced search’, que acessa uma outra página com mais opções de refinamento, entre elas uma que permite inclusive que o sistema considere variações gramaticais de uma palavra – por exemplo, ao procurar por ‘pensar’, o sistema pode também buscar os termos ‘pensou’ e ‘pensando’. São diversas opções, explicadas uma a uma para que o usuário possa restringir a busca de acordo com suas necessidades. O usuário pode restringir o universo especificando o grau de sensibilidade da busca (busca por todas as palavras, apenas por parte da frase, etc.), bibliotecas de arquivos (image, MP3, video, JavaScript), a data de publicação dos documentos, a língua utilizada, etc. É possível também determinar o formato de apresentação dos resultados (descrição completa, apenas título do documento, etc.), e delimitar o número de respostas que o sistema deve retornar em cada página.

Neste site são poucos os serviços oferecidos além da busca propriamente dita. As categorias utilizadas no catálogo são:

Os resultados são apresentados em uma página com desenho mais simples, com menos elementos. Vê-se ao topo da página o campo para entrada de dados que delimitam a busca e o botão ‘search’. Ao lado do campo, onde antes se lia ‘Search Smarter’, aparece o texto ‘Results for’, seguido do campo com as palavras-chave usadas na busca. O usuário com menor expertise pode ficar em dúvida se o campo permite nova entrada de dados ou se apenas indica as palavras-chave usadas.

A listagem dos resultados segue um formato padrão dos mecanismos de busca: o título da página seguido de uma descrição do site e o endereço para acesso. É apresentada ainda uma lista com as categorias e subcategorias que guardam alguma relação com o termo utilizado na busca (por exemplo, ao entrar com o termo ‘Digital Divide’, obtêm-se na relação de categorias a seguinte estrutura: Society/ Issues/ Science and Technology/ Computers/ Internet/ Digital Divide).

O site conta ainda com uma página de ajuda, acessível clicando o botão ‘Help’, localizado na primeira coluna logo abaixo do botão ‘advanced search’. A página de ajuda é organizada por assuntos. Uma lista com as perguntas mais freqüentes remete a outras páginas com mais perguntas sobre aquele assunto. A abrangência de perguntas cobre um grande número de dúvidas freqüentes, mas os termos utilizados são jargões específicos da WWW, o que pode impedir que uma pessoa com pouca familiaridade com o meio compreenda perfeitamente as respostas. Na página de ajuda ainda é possível enviar perguntas diretamente aos responsáveis pelo site.

YAHOO! – http://www.yahoo.com (ver anexo 2)

Diagramação em três colunas, com divisão em três áreas distintas no sentido horizontal, separadas por fios. A diferenciação entre as áreas dá-se também pelo peso visual de cada uma e pela ocupação das colunas.

Na parte superior, no topo da página, o logotipo do Yahoo!, seguido de um banner de anunciantes e do campo para entrada de palavras-chave. Nessa área ainda podemos acessar alguns serviços do site Yahoo!, que cada vez mais vem deixando de ser apenas um mecanismo de busca. A área de entrada de dados fica perdida em meio a uma diversidade de links para serviços, sem que haja qualquer destaque específico ou indicação de como o usuário deve proceder para entrar com os dados. Ao lado do campo de entrada de dados estão localizados o botão ‘search’, para iniciar a busca, e o link ‘advanced search’, para acessar a página de ‘busca avançada’. A busca avançada apresenta algumas opções para restringir o universo da busca com operadores lógicos comuns a maioria dos web sites, sem no entanto haver qualquer explicação a respeito do seu funcionamento.

A parte central da página inicial é reservada ao diretório temático e outros serviços em destaque (o shopping virtual ‘Yahoo Shopping’, a central de notícias ‘In the News’, etc.) A parte inferior apresenta alguns links para outros sites do Yahoo! ao redor do mundo e mais opções de serviços. Não são claros os critérios utilizados na organização da página, que apresenta diferentes tipos de serviços nas três áreas, com ênfases semelhantes. Assim, o diretório temático de certa forma fica camuflado em meio as outras informações.

As categorias utilizadas no diretório são as seguintes:

Para iniciar uma busca o usuário deve escrever uma palavra-chave no campo reservado e clicar o botão ‘search’ ou pressionar a tecla ‘Enter’ no teclado. Outra opção seria explorar o diretório até encontrar um link de interesse.

Os resultados são listados por categorias (lista de categorias que contenham as palavras solicitadas) e por páginas (lista páginas que contenham as palavras solicitadas). O formato segue o padrão comum a quase todos os buscadores: a categoria na qual a página foi catalogada, seguida do título do documento e de uma descrição da página. Para acessar o documento é preciso clicar sobre o título da página, embora não haja qualquer indicação explícita quanto a isto, apenas a convenção usada normalmente para indicar a existência de um link.

Em todas as páginas do site existe um link para a página de ajuda, embora tenha pouco destaque, ficando geralmente no canto direito superior da página. Ao clicar no link ‘Help’, abre-se uma página também organizada por temas, mas não no formato de ‘perguntas e respostas’ como no HotBot. São blocos temáticos genéricos como ‘Searching Yahoo!’, ‘Yahoo Features’, que acessam outras informações específicas dos serviços do site. Nessa página ainda existe a opção para acessar o ‘Yahoo! Help Central’, o que aumenta mais ainda a confusão – ao clicar no botão de ‘Help’ você não acessa diretamente a página de ajuda, mas uma página intermediária que funciona como um manual de instruções para utilização do site como um todo, e não apenas do mecanismo de busca. Vale lembrar que o Yahoo! vem buscando deixar de ser apenas uma ferramenta para ser um portal de conteúdo, e assim conjuga uma série de serviços diferentes, como shopping virtual, central de notícias, etc.

AltaVista – http://www.altavista.com (ver anexo 3)

Diagramação em quatro colunas, com duas grandes áreas distintas, separadas horizontalmente. Cada área apresenta ainda subdivisões internas.

A parte superior, destacada pela aplicação de cor, é reservada ao mecanismo de busca propriamente dito. Assim como o Yahoo!, o AltaVista também vem deixando de ser apenas uma ferramenta de busca para tornar-se um portal, com compras online, e-mail gratuito e outros serviços, acessíveis a partir de links na parte superior do site, acima e abaixo da região de busca propriamente dita. O usuário preenche o campo, que é precedido pela expressão ‘Find this:’, e clica o botão ‘search’ para proceder a busca. Nessa área ainda é possível acionar o ‘Help’, que acessa uma página com explicações detalhadas a respeito do funcionamento da ferramenta de busca, descrevendo todas as opções disponíveis, com apoio de gráficos explicativos e uma série de perguntas freqüentes com suas respectivas respostas. O pouco destaque dado à opção ‘Help’ na página inicial é um fator que deveria ser reconsiderado, dada a importância da página de ajuda para os usuários menos experientes, que poderiam ficar mais familiarizados com o mecanismo de busca através das informações contidas nessa página.

Assim como a maioria dos sites de busca, o AltaVista também apresenta uma opção de busca avançada – ‘Advanced Search’. Entretanto, esse item não tem um destaque especial, ficando no mesmo nível hierárquico das outras opções de busca – busca exclusiva por imagens, por arquivos de áudio e por arquivos de vídeo. Clicando no ‘Advanced Search’ se acessa uma página com algumas novas opções para restrição do universo da busca, sem no entanto haver qualquer explicação sobre seu funcionamento. Há um link para ‘Advanced Search Help’, que semelhante ao ‘Help’ explica o funcionamento geral da ferramenta. Ainda há o link ‘Advanced Search Tutorial’, que explica passo a passo como o usuário deve proceder para utilizar o AltaVista; um manual de instruções para aqueles com pouco ou nenhum conhecimento sobre mecanismos de busca de maneira geral, mas ainda assim restrito àqueles que já têm alguma familiaridade com a WWW.

A segunda grande área do site contém o diretório temático e diversos outros serviços, como um noticiário com as manchetes do momento – ‘Breaking News’, artigos – ‘What’s on AltaVista Now’, produtos desenvolvidos pelo AltaVista, shopping online – ‘Comparison Shop’, links para o AltaVista em outros países. Nessa grande área, a diagramação utiliza as quatro colunas para separar os assuntos, além do uso de fios e da aplicação de cor no cabeçalho das seções. As duas colunas centrais são reservadas ao diretório temático do catálogo de endereços. Interessante ressaltar que o AltaVista foi um dos primeiros mecanismos de busca surgidos na WWW, e no princípio não trabalhava com os diretórios, apenas com a busca automática. Com a popularização das ferramentas de busca, o AltaVista seguiu o padrão da maioria dos concorrentes e passou a organizar os dados também no formato de diretórios.

Os temas apresentados são os seguintes:

Para acionar o mecanismo de busca, o usuário deve preencher o campo reservado (‘Find this:’) e clicar o botão ‘Search’, ou pressionar a tecla ‘Enter’ no teclado do computador. Outra opção é explorar o diretório temático até encontrar o documento desejado.

Os resultados são apresentados de maneira semelhante a maioria dos mecanismos de busca, com algumas diferenças quando a busca é realizada pelo mecanismo de busca propriamente dito, e quando é feita através do diretório. No primeiro caso a lista de resultados é organizada da seguinte forma: o título da página, seguido das primeiras frases contidas no documento, o endereço da página e a data da última modificação, além de um link para efetuar a tradução do resultado para outra língua. Quando a busca é realizada pelo diretório, o resultado é uma lista onde se vê apenas o título do documento e um resumo do conteúdo, fornecido pelo responsável pela página. Não é possível saber o endereço das páginas, mas pode-se acessá-las clicando nos títulos. Não há opção para tradução.

SEARCH.COM – http://www.search.com (ver anexo 4)

O Search.com é um portal para outros mecanismos de busca específicos, com temas restritos como ‘music’, ‘people’, ‘health’, etc. São mais de 100 mecanismos de busca diferentes. Ainda assim é possível realizar uma busca irrestrita, em toda a rede, como na maioria dos mecanismos conhecidos.

A página inicial é diagramada em quatro colunas, com três grandes áreas separadas horizontalmente (Search the Web, Specialty Searchers, Express Search). A distinção das áreas dá-se pelo uso da malha diagramática e aplicação de cor.

Logo no topo da página uma área destaca-se das demais pelo uso da cor. Esta área é reservada para o logotipo do site, além dos links ‘home’ (que leva à própria página inicial do site), ‘about’ (que contém informações a respeito do site), ‘Help’ (que acessa a página de ajuda) e ‘subscribe’ (cadastro de usuários no site). Logo abaixo um banner de anúncios e o mecanismo de busca principal, ocupando 3 colunas.

Clicando na palavra ‘Help’, acessa-se uma página que não traz maiores explicações sobre como o usuário deve proceder para realizar uma busca. Na verdade, trata-se de uma explicação genérica sobre os diversos tipos de mecanismo de busca que o Search.com oferece. Ao contrário da maioria dos sites de busca, as instruções são acessadas ao clicar na palavra ‘tips’ (dicas) próxima ao campo de entrada de dados na página inicial. Esse link leva a uma página com as informações necessárias para utilizar o sistema, inclusive com descrição de alguns parâmetros que podem ser utilizados para efetuar uma busca mais complexa. São apresentados alguns exemplos para cada item descrito.

O usuário inicia a busca entrando com palavras-chave no campo reservado (‘search for:’) e clicando o botão ‘search’, ou pressionando a tecla ‘Enter’ no teclado do computador. Pode-se ainda pesquisar o diretório de endereços. Não há opção para efetuar ‘busca avançada’, mas de acordo com as informações apresentadas na página ‘tips’, alguns operadores lógicos podem ser utilizados.

O diretório temático ocupa a área central da página, sem que haja interferência visual de outro tipo de informação, fato comum à maioria dos sites de busca (anúncios, serviços, etc.). As categorias utilizadas no diretório são as seguintes:

Uma terceira área permite que o usuário faça a busca em outros mecanismos populares na rede (HotBot, Yahoo!, Web Crawler, etc.)

A apresentação dos resultados difere dependendo da maneira como a busca é efetuada: quando se opta pela busca ativa com alcance em toda rede (‘Search the Web’) a lista de resultados apresenta o título do documento, seguido de uma parte de texto contida na página, e o endereço para acesso. Apesar de constar o endereço, o acesso para a página só é possível através do link no título do documento. Quando a busca é feita a partir dos diretórios, o que se obtém como resultado são novos links para outros mecanismos indexadores específicos dentro da área temática selecionada. Vale lembrar que o Search.com pretende ser um portal de buscadores, portanto o seu catálogo constitui-se basicamente de outros indexadores, separados por tema. Ao selecionar um dos links no diretório principal, o que se tem como resultado é um outro mecanismo de busca sobre o tema selecionado, o que de certa forma dá ao diretório do Search.com um caráter diverso da maioria dos buscadores. Uma vez realizada nova busca dentro desse universo restrito, o formato da apresentação dos resultados é o padrão mais utilizado nos mecanismos de busca baseados em diretórios: título do documento seguido de um resumo do site. O link para o documento é o título do site.

SAPO – http://www.sapo.com.pt (ver anexo 5)

O Sapo é um mecanismo de busca português, com uma variedade de serviços que permitem considerá-lo também um portal, assim como o Yahoo! e o AltaVista. É diagramado em quatro colunas, distinguindo-se duas áreas principais – uma ocupando a primeira coluna e outra que se subdivide em partes menores, numa das quais se localiza o diretório temático.

Como na maioria dos sites, o logotipo está localizado no topo da página, à esquerda, na primeira coluna. Ao seu lado, em destaque, um banner com anúncios publicitários ocupa as três colunas restantes. O mecanismo de busca ativa situa-se entre o banner e uma faixa com serviços do portal. O excesso de informação existente (banner, faixa com serviços) prejudica a localização do mecanismo de busca, que chega mesmo a ter um caráter secundário. Vale lembrar que o Sapo também vem deixando de ser um mecanismo de busca para firmar-se como um portal, daí valorizar outro tipo de informação na concepção de sua página inicial. A abordagem utilizada sugere mais uma revista de variedades do que um serviço de busca.

Para ativar o mecanismo de busca o usuário deve preencher com palavras-chave o campo reservado, que encontra-se precedido da palavra ‘Pesquisar’, e clicar no botão com o desenho de um triângulo, uma referência que pode não ser clara para a maioria das pessoas acostumadas a usar a rede, e provavelmente indecifrável para aqueles pouco familiarizados com o sistema. É possível ainda ativar a busca pressionando a tecla ‘Enter’ no teclado do computador.

A coluna da direita é dividida em ‘Canais’, ‘Serviços’, ‘Discussão’, ‘Auxiliar’ e ‘PT Multimédia’, com diversos links espalhados em cada categoria. Vale destacar o ‘Auxiliar’, que contém informações sobre como utilizar o site (‘Ajuda’), e no entanto aparece no final da página, numa região de pouca visibilidade. O usuário com pouco conhecimento na utilização dessas ferramentas teria dificuldade em encontrar esse link, e conseqüentemente, em obter informações sobre o funcionamento do site.

O diretório de endereços encontra-se na parte central da página, logo abaixo da seção de notícias do site. As categorias utilizadas são:

Abaixo do diretório existem ainda outras seções (‘Destaque’, ‘Internet Grátis’) e um outro espaço para propaganda, com menor peso do que o banner que abre a página.

As respostas da busca são organizadas de maneira semelhante à maioria dos sites desse tipo: o título do documento (link de acesso), o endereço do site, um trecho do documento no qual as palavras-chave procuradas aparecem em destaque (negrito), e o tamanho do documento em Kbytes.

Acessando a página de ajuda, tem-se uma descrição do funcionamento da ferramenta de busca, explicando como proceder uma busca simples e como usar operadores lógicos, com exemplos para cada item. Não há qualquer explicação a respeito dos diretórios e de sua diferença em relação à busca dinâmica.

UruguayTotal – http://www.uruguaytotal.com.uy (ver anexo 6)

Site uruguaio, voltado para o conteúdo da Internet daquele país. Diagramação em três colunas, com divisão da página horizontalmente em três áreas distintas. No topo da página, na parte central, o logotipo é ladeado por banners publicitários. Abaixo, uma série de links para serviços do site, e outro banner publicitário com maior destaque. Interessante ressaltar que o banner é caracterizado textualmente como ‘Espacio de publicidad’.

A ferramenta de busca é destacada com aplicação de uma faixa de cor ao fundo, ocupando as três colunas da página. O site também segue o esquema de organização por diretórios, e a opção padrão de busca é realizar uma varredura dentro do catálogo, podendo ser restrita a determinado diretório. Para acionar o mecanismo, é preciso preencher o campo reservado (ao lado do campo que define a categoria a ser varrida, por sua vez ladeado pela expressão ‘Buscar en:’) e clicar o botão ‘Buscar’, ou pressionar a tecla ‘Enter’ no teclado do computador. Não há mecanismo de busca avançada ou um link para página de ajuda/instruções. Não há indicação alguma sobre como utilizar o site.

Abaixo da ferramenta de busca temos o diretório temático e um espaço com as principais manchetes dos jornais uruguaios na sua versão web. O diretório temático destaca-se pela utilização da cor e do peso maior na tipografia.

As categorias utilizadas no diretório temático são as seguintes:

A apresentação dos resultados depende da forma de consulta. Mesmo usando o mecanismo de busca, pode-se restringir o universo ao catálogo, onde as páginas são apresentadas no formato ‘título (com link) e resumo’. Se a busca for expandida para além do catálogo, o formato é: categoria a qual a página pertence, título (com link), trecho da página onde ocorre a palavra-chave, endereço da página (com link), data da inclusão e tamanho da página em Kbytes. Na primeira opção (busca por categorias) cada resultado é precedido de um ícone que indica se a página é de procedência uruguaia ou estrangeira. Tal artifício não ocorre quando se faz a busca ampliada.

Cadê? – http://www.cade.com.br (ver anexo 7)

Primeiro site brasileiro desse tipo, o Cadê? talvez seja ainda o mais conhecido no Brasil. Durante a coleta de dados para essa pesquisa, o Cadê? teve sua interface reformulada, refletindo o crescimento do mecanismo de busca para o portal Cadê?, que passa a agregar mais serviços, como o ‘Cadê? Livros’, ‘Cadê? English Town’, ‘Cadê? Você’, etc. Passa também a apresentar artigos de opinião (‘Destaques’) e uma central notícias (‘Notícias’).

O desenho da página segue o padrão usado pela maioria dos sites. Duas áreas distintas horizontalmente, ficando a parte de cima restrita ao mecanismo de busca e links para os outros serviços do portal, e a parte de baixo para o diretório temático e as novas seções (‘Notícias’ e ‘Destaques’). O logotipo do Cadê? ocupa o topo da página, centralizado. Logo abaixo, links para os serviços do portal.

O mecanismo de busca fica localizado abaixo dos links para serviços, sem que haja maior interferência de uma área para outra. Ao lado do mecanismo, um banner publicitário (explicitamente descrito como ‘Publicidade’). Para acionar a busca, o usuário deve preencher o campo reservado, posicionado logo abaixo da palavra ‘Consulta’, e clicar o botão ‘Busca’, ou pressionar a tecla ‘Enter’ do teclado do computador. Logo abaixo do campo de entrada de dados, um link para ‘Opções de busca’. Esse link leva a uma página com descrição de algumas opções para refinamento da busca. O usuário com maior expertise no uso da WWW poderá achar que, comparado aos outros buscadores analisados, o Cadê? utiliza poucos recursos, carecendo de um mecanismo de ‘busca avançada’ mais eficiente. As explicações são acompanhadas de alguns exemplos e de comentários das situações nas quais deve-se optar por uma ou outra forma de consulta.

O diretório temático localiza-se abaixo do mecanismo de busca, organizado em duas colunas. Ao lado do diretório, ocupando a terceira coluna, as seções do site, destacadas com uso de cor em boxes e de uma tipografia mais leve, com corpo de letra reduzido, que procuram garantir uma distinção em relação ao diretório temático. As categorias utilizadas são as seguintes:

O Cadê? não trabalha com indexadores automáticos, como o AltaVista. Nesse sistema, os dados são acrescentados manualmente pela equipe responsável. Dessa forma, cada documento é catalogado em uma categoria específica, e os resultados da busca são apresentados sempre no mesmo formato: a categoria na qual o item se encontra, seguida do título do documento (com link de acesso) e uma descrição do conteúdo, com destaque (negrito) na ocorrência da palavra-chave, quando for o caso. O endereço das páginas não é apresentado.

Prokura – http://www.prokura.com.br (ver anexo 8)

Este site brasileiro também teve seu projeto modificado durante a realização dessa pesquisa. A página é diagramada em quatro colunas, com quatro áreas distintas – uma para o mecanismo de busca, outra para o diretório e outras seções, uma terceira com canais e serviços do site, e a última com caráter incerto.

O logotipo fica bem no topo, à esquerda, com um banner publicitário ao lado. Logo abaixo, um box delimita a área do mecanismo de busca – sem muito destaque em relação ao restante da página – e outros serviços.

A busca é acionada preenchendo o campo reservado, ao lado da palavra ‘Busca:’, e clicando o botão ‘Buscar’. Há a opção para a ‘Busca Avançada’, ao lado do botão ‘Buscar’. A página de busca avançada disponibiliza alguns operadores lógicos, com poucas explicações sobre o seu funcionamento.

O diretório temático não tem um destaque específico em relação ao todo da página. Sua posição, a utilização de tipografia com peso semelhante aos itens no entorno, o excesso do uso de boxes, cores e fios em toda a página acabam por aumentar o nível de ruído. Mesmo para o usuário mais acostumado a usar a WWW, pode ser difícil estabelecer uma hierarquia entre os itens da página e conseqüentemente ocorrerá um conflito.

As categorias utilizadas são as seguintes:

É interessante perceber que não foram utilizadas as subcategorias, como ocorre na maioria dos sites de busca. Essa supressão dificulta o entendimento de que tipo de páginas podem estar sob cada categoria, uma vez que os termos são extremamente genéricos – por exemplo, o que caberia dentro de ‘Referência’? Apenas aqueles que já conhecem os mecanismos de busca poderiam arriscar uma comparação – geralmente esse item refere-se à mapas, dicionários

A apresentação dos resultados segue o padrão: título do documento (com link), um trecho onde ocorre a palavra selecionada destacada em negrito (quando for o caso de busca ativa), e o endereço do site (sem link).

Radar UOL – http://www.radaruol.com.br (ver anexo 9)

O Radar UOL é a ferramenta de busca do portal Universo Online. Sendo um subproduto do portal, a página não apresenta informações que não dizem respeito à busca propriamente dita, como ocorre no caso dos portais AltaVista e Yahoo!. O design da página reflete esse caráter de ‘ferramenta de busca’. São duas colunas distintas, uma com a ferramenta de busca propriamente dita e outra com serviços agregados. Nesse site não há organização de páginas em diretórios temáticos.

O topo da página é reservado aos links para outros produtos/serviços do portal. Logo abaixo um banner publicitário ocupa as duas colunas. O logotipo do site fica localizado abaixo do anúncio, no canto esquerdo, ladeado por um banner que faz propaganda do próprio Radar Uol. A coluna da esquerda é destacada pelo uso de cor, com botões para serviços específicos da ferramenta de busca (busca de e-mails, acréscimo de endereços, busca nos arquivos do provedor, etc.). Nessa área há o link ‘Ajuda’, que acessa uma página com instruções detalhadas do funcionamento da ferramenta de busca e as opções que podem ser utilizadas para restringir o universo da pesquisa. A utilização de termos técnicos como ‘menu pull-down’ torna o entendimento uma possibilidade apenas para os mais experientes.

O mecanismo de busca fica em destaque na região central da página. A busca é iniciada quando o usuário preenche o campo reservado (não há indicação para que o usuário identifique a área onde deve escrever as palavras-chave) e clica o botão ‘Busca’. Na mesma área é possível ainda restringir o universo da busca (somente no Brasil, somente sites na língua portuguesa, etc.), usar operadores lógicos, e delimitar o número de respostas por página, etc. Ainda assim, não bastassem essas variáveis, é possível acessar a ‘busca avançada’, que apresenta um número maior de opções para restrição da busca (data de publicação do site, busca por tipo de domínio, busca por tipo de arquivo, etc.). Não há explicações sobre esses mecanismos, a não ser que o usuário clique em ‘Ajuda’. Como o botão de ajuda não está em destaque, o usuário mais desatento e com menor familiaridade com o site pode enfrentar dificuldades para entender o seu funcionamento, que dirá um usuário com baixo índice de letramento.

A lista de resultados da pesquisa segue o seguinte formato: título da página (link), endereço (sem link) seguido de um trecho do documento, o tamanho em bytes e a data de publicação.

3.2 análise dos dados

Comparando os dados dos mecanismos de busca selecionados, algumas questões emergem e suscitam discussão. Percebe-se a repetição de padrões no design das páginas, quase como um modelo a ser preenchido com dados específicos de cada site. A disposição do logotipo, a localização da ferramenta de busca, a diagramação dos sites, as categorias utilizadas na organização dos diretórios, a formatação dos resultados da busca – a maioria dos sites guarda claras semelhanças nas soluções adotadas no seu projeto gráfico. As variações são apenas ‘epidérmicas’, não há sensível diferenciação estrutural entre os sites. Pode-se argumentar que a similaridade dos sistemas garante que um usuário familiarizado com um dos mecanismos tenha facilidade em usar outros sistemas, mas ao mesmo tempo denota a falta de criatividade no desenvolvimento dos mecanismos de busca, e deixa clara a imposição de um modelo mental que privilegia a ordenação cartesiana das informações.

Tendo em vista os investimentos crescentes relativos à expansão da rede, a integração das mídias em diversas instâncias da coletividade, a presença cada vez mais intensa da Internet em grande parte das atividades econômicas, parece claro que saber operar os mecanismos de busca torna-se importante para uma integração do indivíduo à sociedade da informação. Contudo, tendo em vista o atual modelo utilizado na maioria dos sites de busca, percebe-se que aqueles que não partilham dos repertórios culturais dos grupos dominantes, que são o padrão utilizado no desenvolvimento dos aplicativos para a rede, estão excluídos de qualquer possibilidade de vir a participar de igual para igual neste cenário. Em países como o Brasil, onde o analfabetismo ainda é um problema sem solução a vista, tem-se agravado o quadro de exclusão social crônico; a sociedade da informação que vem se formando está criando novas formas de exclusão, desconsiderando a possibilidade de pessoas com baixo índice de letramento virem a se beneficiar dos sistemas de informação existentes. Como dito anteriormente, o lado perverso desta situação é que o fortalecimento e a afirmação desse tipo de tecnologia não ocorrerá sem afetar diretamente a vida de todos os cidadãos, sejam eles participantes ativos ou não do ciberespaço.

Não há dúvidas quanto ao caráter excludente que tem marcado o desenvolvimento da World Wide Web; a análise dos mecanismos de busca deixa claro ainda que não há a intenção de favorecer uma navegação rápida, direta. Estes dispositivos, que deveriam ter o papel de intermediadores entre o universo de informações dispostas na rede e o usuário, ao contrário do que se espera, parecem ter sido formulados para deliberadamente dificultar a busca de informações específicas, apresentando uma série de dados secundários simultaneamente, sem que haja qualquer preocupação em hierarquizar as informações visualmente. Como interpretar o fato de que o projeto da interface de tais ferramentas, desenvolvidas em sua maioria em países nos quais o design há muito foi incorporado à cultura material, ignore completamente questões de legibilidade na organização de suas páginas, a não ser como uma atitude deliberada para confundir o usuário e mantê-lo ‘preso’ aos sites em busca de informações?

As categorias de análise adotadas na observação dos sites explicitaram alguns pontos que ratificam o caráter excludente de tais ferramentas. Torna-se patente a necessidade de se pensar alternativas para a elaboração da interface das ferramentas de busca, de modo a facilitar o entendimento de seu funcionamento não só por pessoas pouco familiarizadas com o ambiente da WWW, mas também por indivíduos com diferentes estágios de letramento, que mais cedo do que se imagina estarão sendo forçados a conviver com códigos completamente estranhos à sua formação e cultura. De posse dessas informações, o designer poderá propor soluções que, embora provavelmente não alterarão estruturalmente os sistemas existentes, poderão colaborar significativamente na utilização dos sites por pessoas com níveis cognitivos e educacionais diversos.

O objetivo do site geralmente não é claro e o projeto gráfico poucas vezes facilita esse entendimento

Em alguns dos sites analisados percebeu-se uma certa confusão quanto à própria definição do seu objetivo principal. Sites como o Yahoo! e o AltaVista surgiram como ferramentas de busca, e com o passar do tempo foram agregando serviços que pouco a pouco foram modificando sua função principal, deixando de ser apenas ferramentas de busca ou indexadores de páginas para se tornarem portais de acesso à uma variedade de informações e serviços online. Essa situação transitória, quando começam a deixar de ser ferramentas de busca para tornarem-se portais, pode ser percebida pela indefinição de uma identidade própria nas suas interfaces, que guardam características explícitas de mecanismos de busca, e ao mesmo tempo procuram anunciar a gama de serviços que dispõem, sem no entanto privilegiar um ou outro papel. Ocorre mesmo um conflito, um grau de ruído indesejável pelo excesso de informação que não parece favorecer o usuário, principalmente aquele cuja alfabetização em mídia ainda é incipiente, e portanto tem dificuldade em analisar e selecionar a informação disponível, reconhecendo o que de fato é importante e o que não lhe interessa naquele momento. O design do site deve deixar claro a que serve aquele espaço: se o site pretende ser um indexador, essa característica deve ser explicitada em detrimento de outras características que possa apresentar; se pretende ser um portal, a ferramenta de busca passa então a ter um papel menor, constituindo-se um subproduto, como no caso do Radar UOL do portal brasileiro Universo Online.

É possível ainda que essa ‘indefinição’ da identidade dos sites seja proposital. A maioria dos portais, ou ‘sites de conteúdo’ como também são conhecidos, pretende oferecer diversos serviços e informações de maneira a garantir a permanência do usuário em seu espaço na rede. Trabalha-se com a perspectiva de uma navegação limitada ao universo de páginas ligadas ao portal, e nesse sentido a existência de uma certa confusão visual dá-se devido à necessidade de apresentar a variedade de informações disponíveis logo na página inicial do site. Há que se argumentar que esse excesso de informação não justifica um projeto gráfico confuso, onde ocorram ruídos e o usuário tenha dificuldade de fazer uma leitura da página. Isso leva à segunda questão, examinada a seguir.

A necessidade de definição clara de áreas com propósitos distintos

Percebe-se ao analisar os mecanismos de busca a falta de hierarquia das informações. Se consideramos o mecanismo de busca dinâmica e o diretório temático como as áreas mais importantes dos sites de busca tal qual existem hoje, é evidente a necessidade de destacá-los das demais informações. Entretanto, na maioria dos sites analisados ocorre justamente o oposto; dificilmente esses dispositivos estão em destaque – mesmo o usuário com alguma familiaridade com a WWW poderá ter alguma dificuldade em identificar a localização dessas áreas, e usuários analfabetos em mídia provavelmente não terão a menor chance de perceber a existência de qualquer diferenciação dos blocos de informação em meio a tanto ruído.

Há que se destacar que essa confusão muitas vezes é intencional e envolve questões mais complexas do que a comunicação visual do site. Um dos assuntos em discussão no meio internauta hoje é justamente a utilização pelas grandes empresas, de dispositivos para monitorar a navegação dos usuários e identificar seus hábitos, de maneira a compor cadastros com informações específicas sobre cada indivíduo que utiliza os serviços de determinado site. Para que esse monitoramento seja possível, é necessário manter a navegação restrita a um ambiente controlado, o que implica a existência da maior variedade de informações possível em um mesmo espaço, como ocorre nos portais. Essas estratégias de controle da navegação não chegam a ser novidade, de fato são bastante conhecidas e utilizadas em outros contextos da vida moderna, seja nos supermercados que alteram a arrumação de suas seções de tempos em tempos para garantir a ‘navegação’ dos clientes por diversas áreas e assim aumentar as chances de seduzi-los a comprarem produtos que não estão em suas listas de compras, seja nos ‘shopping centers’ que dificilmente contam com sistemas de sinalização elucidativos, que permitam a localização tanto espacial quanto temporal, fazendo com que o cliente ‘navegue’ a esmo, exposto a diversas ‘tentações’ desses centros de consumo. Não por acaso muitos dos shoppings evitam qualquer entrada de luz natural, para que os clientes não tenham a menor noção do tempo gasto em sua ‘navegação’ e permaneçam um período maior em suas dependências. Essas estratégias foram refinadas com a utilização das tecnologias da informação; agora é possível acompanhar com precisão cada passo dado pelo internauta em suas navegações pelo ciberespaço, registrando seus gostos, seus interesses, compondo mesmo um banco de dados preciso sobre cada pessoa presente na rede. As implicações desse controle são nefastas, como registra Teixeira:

A Web pode estar se transformando numa cela a que o usuário estará confinado, trazendo acorrentados à canela sua identidade e seus hábitos de consumo. A privacidade do indivíduo novamente está sendo atacada de forma corrosiva, com o perigo de que se forme uma sociedade baseada na vigilância indiscriminada do cidadão, prejudicando seriamente a confiança do consumidor na Internet. (Teixeira, 2000:4)

Para a eficiência desse sistema, o ‘caos’ visual percebido na maioria das ferramentas de busca que se assemelham a portais é necessário, de maneira a induzir o internauta a navegar a esmo em suas páginas, semelhante ao cliente do shopping que tem dificuldade em achar a saída na qual deixou estacionado o seu automóvel.

Se aqueles usuários com algum conhecimento da WWW encontram essas dificuldades, o que resta ao cidadão semi-analfabeto que terá que enfrentar essas máquinas, a não ser a exclusão completa do sistema (Spitz, 1999)?

É necessário que o usuário possa aprender a usar o sistema – o site deve prever instruções de uso, e estas devem ser facilmente identificadas, acessadas e compreendidas pelo usuário

Para o usuário mais ‘alfabetizado em mídia’, a utilização das ferramentas de busca depende menos das soluções de design adotadas na página do que de sua habilidade em analisar quais elementos estão presentes, identificar a área de entrada de dados e qual o mecanismo necessário para dar início à busca. Entretanto, para aqueles que não possuem essa habilidade acentuada, a identificação do funcionamento das ferramentas de busca pode não ser tão imediata, e para indivíduos com baixo índice de letramento que desconhecem as convenções e a lógica utilizada na WWW, provavelmente tal tarefa será impossível. Como supor que uma pessoa com pouca ou nenhuma experiência na utilização da rede irá compreender que deve clicar com o mouse sobre uma determinada área da tela do computador, escrever uma palavra e em seguida clicar novamente em outra área da tela? A simples enunciação dessa seqüência de ações pressupõe um nível de abstração típico daqueles que já utilizaram esses sistemas. A associação da imagem de um retângulo branco em meio a uma tela de computador – isso quando for possível identificá-lo em meio a tantas informações visuais – com um campo a ser preenchido com palavras digitadas ao teclado, é extremamente difícil para aqueles que não compartilham desse repertório simbólico. Situação semelhante foi percebida por ocasião da utilização de urnas eletrônicas na última eleição ocorrida no Brasil, quando a população analfabeta viu-se frente a frente com uma máquina cuja interface desconsiderava a possibilidade de uma pessoa não compreender o funcionamento de um teclado numérico:

O ordenhador Américo Barcelos, de 32 anos, coça a cabeça, recorre à cola com os números dos candidatos fictícios nos quais deverá votar, fixa por um momento o olhar nas vacas do curral da Fazenda Cascata e cria coragem. Começa a apertar as teclas da primeira urna eletrônica que já viu na vida. Erra cada um dos cinco algarismos e anula a votação para deputado federal. O chefe do cartório eleitoral em Sumidouro, Everaldo Faddul, ainda tenta salvar o voto seguinte, para deputado estadual.

– Olhe agora o próximo número no papel, Américo. Tem quatro algarismos. É só digitar com calma, cada um – interfere.

Américo se dirige novamente à máquina desafiadora e levanta os olhos para os morros que circundam a fazenda, como se pedisse ajuda aos céus. Hesitante, como se os dedos não obedecessem ao seu comando, demora tanto a digitar o terceiro dos cinco algarismos que a máquina apita. Está anulado o voto para deputado estadual. As demais tentativas resultam em mais votos nulos: para presidente, governador, senador. Américo deixa frustrado a máquina, depois de 12 minutos de constrangimento e esforço inútil.

– Eu não disse? Vai ser uma loucura. Temos muitos analfabetos e eles não conseguem se concentrar nos números. Antes, o analfabeto pegava a cédula, passava um tempo disfarçando e a depositava na urna. O sofrimento agora é maior – teme o chefe do cartório. (Filho e Anderson, 1998)

A dificuldade em relacionar números escritos em um pedaço de papel com o ato de pressionar teclas numéricas em uma determinada seqüência não parece ter sido considerada pelo chefe do cartório mencionado na reportagem. Para uma pessoa que opera segundo uma lógica diversa à dos que desenvolveram o sistema, não há relação possível entre um número escrito em um pedaço de papel e um conjunto de teclas numéricas de uma urna eletrônica. De maneira análoga, a interface dos mecanismo de busca não indica em nada como deve proceder o usuário que deseja operar o sistema.

É desejável que os mecanismos de busca apresentem informações sobre como utilizar as ferramentas. A solução encontrada pela maioria dos sites para essa questão foi a elaboração de uma ‘página de ajuda’, mas nem sempre as informações contidas nessas páginas colaboram para compreensão do funcionamento do sistema, seja pela utilização de termos herméticos, típicos de quem domina o repertório usado na WWW, seja pela carência de exemplos e identificação dos elementos descritos na página. Ademais, o próprio acesso à página é restrito àqueles que já dominam a navegação em sistemas de hipertexto e identificam as palavras-chave que acessam essas informações.

Mesmo os usuários que têm alguma familiaridade com a rede podem sentir alguma dificuldade em identificar o acesso à página de ajuda. A maioria dos sites utiliza um link onde se lê ‘Help’, ‘Ajuda’, em locais que não são imediatamente identificados. Vale lembrar que a parte superior das páginas é a área privilegiada, por ser imediatamente visível nos monitores dos computadores. Informações colocadas próximas ao pé da página muitas vezes sequer são vistas pelos usuários, por estarem fora da área de exibição dos monitores. Esse é o caso do HotBot, cuja página de ajuda é acessada clicando um botão onde se lê ‘Help’, localizado na primeira coluna da página, próximo a outros botões como ‘Advanced Search’ e ‘Submit web site’, com nenhum destaque em relação às outras informações. No site do Yahoo! o botão ‘Help’ está localizado à direita do logotipo, com a mesma importância dos botões ‘What’s New’, ‘Check Mail’, “Personalize’. No site Search.com ocorre uma confusão ainda maior; no topo da página, no canto direito, em meio a outros links aparece a palavra ‘Help’. Ao clicar no link, o usuário acessa uma página na qual constam informações sobre os diferentes mecanismos e busca contidos no site, mas não há nenhuma indicação de como utilizá-los, ao menos não no sentido prático necessário para aqueles que não dominam os códigos. Entretanto, se o usuário clicar no link ‘Tips’, próximo ao mecanismo de busca, localizado ao lado do logotipo da empresa de desenvolvimento do site, encontrará uma página com as informações sobre o funcionamento básico, comum a todas as ferramentas de busca.

A utilização de termos como ‘Help’, ‘Tips’, ‘Ajuda’ ou ‘Dicas’ como acesso às informações sobre o funcionamento do site não parece favorecer aqueles com menor experiência no uso de computadores. Seria mais interessante o uso de expressões mais explícitas, como por exemplo ‘Como eu faço uma busca?’ ou ‘Para aprender a fazer uma busca, clique aqui’. Quando se limita o universo de usuários àqueles alfabetizados em mídia, a utilização dessa terminologia pode ser uma solução eficiente, mas quando falamos em usuários com diferentes níveis cognitivos, é necessário pensar outros mecanismos para ensiná-los a usar o sistema. Como esperar que uma pessoa semi-analfabeta compreenda informações escritas em uma página web, quando a leitura em si é uma atividade com a qual tem pouca familiaridade?

Os mecanismos utilizados para acionar a busca exigem o conhecimento prévio de seu funcionamento

Assim como o link para página de ajuda, o campo reservado à digitação das palavras-chave deveria ser facilmente identificado pelo usuário, seja na definição de uma área própria, seja pela utilização de dispositivos que indiquem a função do campo. Na maioria dos sites analisados, a área de entrada de dados é precedida por alguma expressão, que busca indicar ao usuário que o campo adjacente é reservado à digitação das palavras-chave. No entanto, ao que parece, parte-se do pressuposto que o usuário sabe que deve escrever alguma coisa naquela área, e como deve proceder para iniciar a busca. Tomando como exemplo o site AltaVista: ao lado do campo de entrada de dados lê-se ‘Find this:’. O usuário não é informado que deve clicar no campo ao lado da referida expressão e digitar as palavras-chave. Pode-se afirmar que esse nível de informação não cabe na página principal, devendo ser descrito na página de ajuda, mas essa observação aplica-se apenas àqueles que já sabem como operar o sistema. Para um indivíduo que nunca teve contato com essas ferramentas, é praticamente impossível compreender como iniciar uma busca. A simples substituição da expressão por algo mais explícito poderia minimizar a questão, ao menos para aqueles com alguma compreensão do ambiente da WWW. Ao invés de ‘Find this:’, por que não ‘Escreva aqui ao lado o que deseja procurar:’ ou algo semelhante? Alguns dos sites analisados sequer utilizam qualquer expressão para indicar ao usuário onde ele deve preencher os dados.

Da mesma forma, o botão que aciona a busca (embora os usuários mais experientes geralmente sequer utilizem o botão, simplesmente pressionando a tecla ‘Enter’ do teclado) também é alvo de confusão. Quase todos os mecanismos utilizam a palavra ‘Search’ escrita no botão de acionamento – no caso dos sites brasileiros, e do UruguayTotal, o equivalente, ‘Buscar’, ou ainda ‘Busca’ – o que não parece deixar claro que o botão inicia a busca, podendo ser confundido com um link para uma outra página, onde provavelmente o usuário encontrará o mecanismo de busca! O site Sapo optou por utilizar um ícone, que certamente será interpretado de diversas maneiras por usuários com repertórios diferentes. Essa abordagem adotada pelos sites analisados pressupõe que todos os usuários terão conhecimento das etapas necessárias para iniciar a busca: escrever palavras-chave no campo reservado e em seguida clicar o botão que aciona o mecanismo. É preciso ter em mente que esses procedimentos não são familiares a qualquer pessoa, e procurar soluções que contemplem essas diferenças.

As opções de refinamento de busca implicam a compreensão de operações lógicas complexas

Para realizar uma busca eficiente, é ideal que o usuário tenha conhecimento das opções de refinamento da busca. A maioria dos sites conta com mecanismos de busca avançada que restringem o universo de respostas possíveis, de acordo com variáveis controladas pelo usuário. Dado o crescimento do número de sites na Internet, saber restringir uma busca é fundamental para obter um número de resultados que possa ser efetivamente explorado. Entretanto, embora grande parte dos sites de busca disponham dessas ferramentas, muitas vezes o usuário menos experiente poderá não vir a utilizá-las, já que na maioria das vezes essas opções só estão disponíveis em outro nível de navegação, sendo necessário acessar uma página específica para efetuar a busca avançada.

Mesmo os usuários com algum conhecimento de navegação podem encontrar dificuldades em identificar a existência de uma opção de refinamento de busca. Na grande maioria dos sites analisados, o link para a busca avançada encontrava-se hierarquicamente igualado a outros links menos importantes (como ‘submit a web site’, ‘videos’, ‘images’, ‘multimedia search’). Apenas nos sites Yahoo! e Cadê? o link estava próximo ao mecanismo de busca principal (ao lado do botão de acionamento da busca), sem fazer parte de um grupo de informações, como ocorre no AltaVista e no HotBot. Além da posição, o termo usado para explicitar a função do link pouco favorecia o entendimento de sua função. Na maioria dos sites utilizou-se a expressão ‘Advanced Search’; no Cadê? lia-se ‘Opções de Busca’. Talvez essas expressões sejam claras para aqueles que sabem que existem outras formas de efetuar a busca, mas possivelmente não significarão muita coisa àqueles que não estão familiarizados com o sistema. O único site analisado que utilizou uma expressão menos sintética foi o Radar UOL, cujo link era ‘Clique aqui para uma busca mais detalhada’, em que pese a própria compreensão do que seja ‘uma busca mais detalhada’.

As instruções dos mecanismos de busca avançada dos sites analisados, em sua maioria, não deixam claro ao usuário como proceder corretamente para restringir uma busca, seja pela falta de exemplos, seja pela linguagem extremamente técnica. Há que se pensar que os possíveis usuários não dominam o mesmo repertório que aqueles que desenvolvem o sistema, e nesse sentido, os termos utilizados devem ser os mais simples possíveis, evitando a utilização de jargões que só serão compreendidos pelos ‘iniciados’. Ademais, a própria concepção da busca avançada pode ser completamente estranha para usuários com baixo índice de letramento. A maioria dos mecanismos utiliza lógica booleana, conceitos de conjuntos, de exclusão e inclusão de acordo com parâmetros definidos pelo usuário. São mecanismos lógicos que podem não ser passíveis de compreensão por indivíduos semi-analfabetos. Se a tecnologia utilizada nesse tipo de busca é uma variável a qual o design não tem acesso, cabe a essa área do conhecimento procurar alternativas no que se refere à interface entre o sistema e o homem, de maneira a permitir a compreensão dos mecanismos lógicos por indivíduos que não seguem esse tipo de raciocínio.

O diretório temático geralmente não é facilmente localizável, e a lógica de classificação pode não ser passível de compreensão

Percebe-se pela análise da amostragem que a organização de um catálogo de endereços é uma prática comum a quase todos os mecanismos de busca, conjugando os dois sistemas – diretório temático e busca em toda a rede. Em alguns casos, a busca por palavras-chave restringe-se às páginas catalogadas no próprio site, mas na maioria das vezes essa modalidade de busca refere-se a toda rede, isto é, a busca é feita em um índice compilado com dados de todas as páginas existentes na WWW, atualizada automaticamente de tempos em tempos. Cada uma dessas modalidades adequa-se mais à procura de um tipo de informação: se o usuário deseja encontrar uma página específica, como por exemplo, a página do Hospital do Câncer de São Paulo, possivelmente a busca diretamente por palavras-chave seja mais adequada. Se deseja verificar a lista de sites dos hospitais que tratam de câncer no Brasil, o diretório temático pode ser mais apropriado. Entretanto, os sites de busca não apresentam qualquer explicação nas suas páginas de abertura sobre as diferenças entre os dois mecanismos, exceto em alguns casos, quando a página de ajuda menciona o fato . Se para os internautas experientes isso pode parecer óbvio, para os inexperientes a diferenciação entre as duas modalidades básicas de busca pode ser difícil, principalmente em sites onde os índices dos catálogos encontram-se praticamente ‘camuflados’. Na grande maioria dos sites analisados, o diretório temático não está destacado de maneira a permitir sua identificação imediata como uma ferramenta para realizar a busca, especialmente nos sites do tipo ‘portal’, nos quais a variedade de serviços e informações existentes concorrem visualmente com o diretório. A utilização equilibrada de fios, aplicação de cor, variações tipográficas podem destacar o diretório em relação ao seu entorno, mas é possível que mesmo com a utilização desses recursos, o usuário que desconheça o que seja um diretório temático tenha dificuldades em compreender seu objetivo e vir a utilizá-lo eficientemente.

Outro fator interessante é a própria definição das categorias que compõem os diretórios. Os temas são bem semelhantes em quase todos os sites analisados, embora muitos pertençam a culturas distintas. Resta saber se os temas são representativos dos assuntos que mais interessam à população que utiliza os serviços ou se apenas aplicou-se um modelo ‘importado’, ‘global’. É interessante destacar que essas classificações são definidas de acordo com a lógica de um grupo de pessoas, responsáveis pelo site, com algumas interferências dos usuários, que podem sugerir novas categorias e formas de ordenar os documentos. Assim, dificilmente as categorias utilizadas serão facilmente apreendidas por qualquer pessoa, como destacado no próprio site AltaVista:

Os diretórios são organizados por seres humanos, baseado em seu julgamento, como arquivos em um porta-arquivos. Se você porventura pensar da mesma forma que a pessoa que organizou um determinado diretório, provavelmente você achará fácil utilizá-lo. Se sua mente é organizada de forma diferente, você provavelmente achará a solução estranha e difícil de acompanhar. (grifo do autor) (tradução nossa)

Curioso perceber a repetição dos itens nos sites de procedências diversas, como se a maneira de organizar a informação fosse idêntica em cada contexto sócio-cultural no qual essas ferramentas são desenvolvidas, e no qual serão utilizadas. De qualquer maneira, essas categorias não são estanques; ao contrário, mudam de acordo com a necessidade e a procura de determinado tema. Na página principal do site Cadê?, a categoria ‘Lazer’ costumava destacar os seguintes tópicos: ‘Infantil’, ‘Turismo’ e ‘TV’. A partir de janeiro, exatamente o período que antecedeu o carnaval, o primeiro item da categoria passou a ser ‘Carnaval’. Além disso, a repetição das categorias é relativa; embora ocorra o termo ‘Sociedade’ na maioria dos sites, os destaques mudam de acordo com o país: no Cadê?, brasileiro, os itens destacados nessa categoria eram ‘ONGs’, ‘Pessoais’ e ‘Religião’; no UruguayTotal em ‘Sociedad’ encontramos ‘Ecologia’, ‘Uruguayos’ e ‘Sexo’; no AltaVista a categoria era chamada ‘Society & Culture’, e destacava os itens ‘People’, ‘Religion’ e ‘Issues’. Fica a dúvida se esses itens são representativos dos interesses da população local ou se efetivamente são mera repetição do um modelo.

Através da comparação entre os sites, fica patente a própria deficiência dos diretórios para organizar a informação, sendo necessário, mesmo para o usuário mais acostumado com a WWW, que cada categoria tenha explícito alguns itens que indiquem que tipo de informações encontram-se naquele grupo. O site ‘Prokura’, por exemplo, apresentou as categorias sem qualquer indicação de que tipo de informações estariam sendo agregadas, o que sem dúvida torna ainda mais complexa a utilização do diretório. Como saber, por exemplo, que informações estão sob o item ‘Referências’? Ou ainda, se assuntos ligados a TV estão em ‘Entretenimento’ ou em ‘Comunicação’?

A organização das páginas por temas pressupõe a capacidade de categorizar a informação, criar grupos de assuntos, um tipo de raciocínio que não necessariamente será compartilhado por pessoas com baixo índice de letramento, ou mesmo em culturas que seguem outra lógica de pensamento. No Peru, onde as cabines de acesso público à rede estão difundidas em grande parte do território, provavelmente a população local, grande parte descendente dos índios, encontrará dificuldade em utilizar essas ferramentas sem auxílio de uma pessoa familiarizada com a rede, simplesmente porque operam segundo outra visão de mundo, não contemplada por esse sistema.

Os resultados da busca são apresentados em formatos variados, sem que o usuário tenha indicações de como acessar as informações

A apresentação dos resultados na maioria dos sites analisados segue dois padrões distintos, que variam de acordo com o mecanismo utilizado para proceder a busca.

Quando a busca é feita diretamente por palavras-chave, o sistema faz a varredura em toda a WWW, consultando um índice compilado de tempos em tempos. A lista de resultados apresenta o título do documento, que funciona como link de acesso – o usuário precisa clicar no título para acessar o referido documento, embora essa informação não seja apresentada em momento algum – presume-se que o usuário conheça o funcionamento do hipertexto e identifique as palavras destacadas como links. Abaixo do título, um trecho do documento é apresentado, seguido do endereço da página. Curiosamente, somente em alguns dos sites analisados o endereço da página funcionava também como link de acesso. É apresentado ainda o tamanho em bytes do documento, e a data de inclusão no índice. A data é interessante porque permite saber se o documento é atual ou se já foi anexado há muito tempo. Dependendo do mecanismo de busca, é possível restringir a procura a documentos cuja publicação tenha ocorrido em um dado período.

Quando o usuário faz a procura pelos diretórios, o resultado apresentado é baseado nas informações do banco de dados do próprio site de busca, que conta com uma série de documentos catalogados. O formato dos resultados segue o modelo: a categoria a qual pertence o documento, o título – que funciona como link de acesso – seguido de um resumo, geralmente fornecido pela pessoa responsável pela inclusão do documento no catálogo do site. Não é apresentada a data de inclusão ou o endereço do site. O UruguayTotal foi o único a discriminar a origem dos documentos – se eram uruguaios ou não.

Essa ocorrência de dois padrões distintos de apresentação dos resultados pode confundir mesmo o usuário razoavelmente habituado com a rede, sobretudo a segunda versão, que apresenta basicamente o título e o resumo. A não utilização do endereço da página como link aumenta a possibilidade de constrangimento no uso do mecanismo de busca, uma vez que não há nenhuma indicação, em todas os sites analisados, de como o usuário deve proceder para visualizar o documento desejado. A listagem não é acompanhada de qualquer explicação, o que leva a crer que acredita-se que todos os usuários poderão compreender como acessar a página que procuram, que todos reconhecerão palavras-chave que funcionam como hipertexto.

Dada a infinidade de respostas possíveis para uma determinada busca, o número de resultados por página é limitado, sendo apresentados blocos de informação, que correspondem aos documentos que se adequam às variáveis utilizadas na varredura. Na maioria dos casos esse número pode ser definido pelo usuário. Os sistemas geralmente apresentam os resultados e indicam quantos documentos foram encontrados naquela pesquisa, e quantos estão sendo disponibilizados naquele bloco. Para acessar os outros blocos de informação, o usuário deve clicar em links no pé da página, indicados apenas por números (cada número corresponde a um grupo de resultados), ou ainda clicar em links como ‘próximo’ e ‘anterior’. Fica a dúvida se essa ordenação por blocos de informação seria passível de entendimento por pessoas com pouca intimidade com esses sistemas, ou ainda com baixo índice de letramento.

O resultado da busca não permite o erro, a imprecisão

A grande maioria dos mecanismos de busca não conta com dispositivos que façam buscas aproximativas, que levem em consideração pequenas variações gramaticais. Se imaginarmos um usuário que não domina completamente a tecnologia da escrita, mas compreende o funcionamento do sistema de busca – sabe como proceder para efetuar uma busca – ainda assim esse indivíduo terá grande dificuldade em operar o sistema, por não dominar efetivamente a escrita. A maioria dos sistemas analisados não permitem erros na grafia, buscam exatamente as palavras solicitadas. Não bastassem as inúmeras dificuldades em compreender a lógica inerente a esses mecanismos, em última instância a barreira do saber formal institucionalizado impede a plena utilização das ferramentas de busca por pessoas com baixo índice de letramento. Resta-lhes ainda a opção de buscar os dados através dos diretórios temáticos, que implicam outro tipo de conhecimento, tampouco acessível a quem não domina o saber formal.

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Parece evidente a prevalência da lógica cartesiana na construção dos mecanismos de busca; conseqüentemente, aqueles que não operam segundo esse modelo de pensamento certamente terão dificuldade em compreender o funcionamento dessas ferramentas, o que deixa claro que os mecanismos de busca não contemplam a imprecisão, a dúvida, os saberes não formalizados.

Fica clara a impossibilidade de pessoas que não partilham o repertório cultural, simbólico e cognitivo dos grupos dominantes, ou ainda aqueles que são analfabetos em mídia, virem a utilizar a WWW da maneira como esta se apresenta hoje, o que ratifica a noção deste veículo como uma ferramenta de manutenção das desigualdades sociais e fortalecimento daqueles que dominam o desenvolvimento tecnológico e ditam as regras no mundo globalizado. É preciso pensar outras formas de interação com o sistema, uma abordagem que privilegie uma lógica não-cartesiana, que permita uma exploração intuitiva. A tecnologia hoje disponível torna perfeitamente possível introduzir variáveis de imprecisão nos sistemas de busca, de maneira que mesmo os sujeitos que não operam de acordo com a lógica cartesiana possam utilizar as ferramentas satisfatoriamente. Pode-se argumentar que o desenvolvimento de um mecanismo que contemplasse a imprecisão tornaria o funcionamento do sistema muito lento para dar conta da quantidade de documentos existentes; ainda assim, mesmo que se mantivesse a estrutura de funcionamento atual, a interface gráfica poderia ser alterada de maneira a fazer uma ponte entre a lógica cartesiana do sistema e o pensamento intuitivo do ser humano.

Indo mais além, dado o caráter inovador do campo do design, aliado ao desenvolvimento tecnológico que ocorre a passos cada vez mais largos, é indiscutível a premência de se subverter a ordem das coisas, de não aceitar as limitações atuais, posto que o desenvolvimento da humanidade jamais se daria com a aceitação de limites, com a resignação às imposições de grupos dominantes. Nesse sentido, o designer deve ser um pouco ‘poeta dos meios tecnológicos’, como sugere Machado:

Ora, explorar as ‘possibilidades’ de um sistema significante implica precisamente colocar-se um limite, submeter-se à lógica do instrumento, endossar seu projeto industrial, e o que faz um verdadeiro poeta dos meios tecnológicos é justamente subverter a função da máquina, manejá-la na contramão de sua produtividade programada. (Machado, 1996:15)

O designer deve procurar ampliar a função da própria Internet, indo além dos limites impostos pelos grupos dominantes, explorando ao máximo as possibilidades tecnológicas existentes, analisando as necessidades reais dos usuários, sua visão de mundo e suas limitações, para propor soluções inovadoras que permitam o desenvolvimento de um sistema mais humanizado, que possa ser utilizado em diferentes contextos, o que poderia efetivamente configurar uma sociedade da informação democrática e plural. A revolução informacional só ocorrerá de fato com a revisão das limitações tecnológicas, cognitivas e políticas engendradas pelos grupos que vêm ditando os rumos do desenvolvimento da rede.

 

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